Corpo de adulto e cabeça de piá

Corpo de adulto e cabeça de piá
Xilogravura de José Altino baseada no romance de Mário de Andrade (Reprodução)
  Mário de Andrade escreveu Macunaíma em seis dias. Em dezembro de 1926, no meio de abacaxis, mangas e cigarras da chácara da Sapucaia, na cidade de Araraquara, despejou no papel a história de um índio negro nascido na floresta amazônica que atravessa o país em busca do seu amuleto roubado por um gigante comedor de gente. Uma jornada que Oswald de Andrade chamou de “nossa Odisseia” e que, 90 anos depois da primeira publicação, se atualiza diante das discussões contemporâneas no âmbito das identidades. Isso porque, como personagem e signo, “Macunaíma tem uma maleabilidade que permite que as mudanças epistemológicas sobre o Brasil ainda estejam representadas nele”, diz a escritora e crítica literária Noemi Jaffe. Grande obra do Modernismo, Macunaíma tornou-se representação do brasileiro num momento em que, na literatura e nas artes, se formulavam novas concepções do que seria uma identidade nacional distante das idealizações do Romantismo do século 19, que projetava nos indígenas um símbolo heroico de nacionalidade. “Hoje, a ideia de identidade se ampliou; fala-se muito em identidade feminina, negra, trans e assim por diante, já não se comporta mais apenas uma identidade tão abrangente quanto a ‘brasileira’”, afirma Jaffe. “Mas o que Mário propõe são múltiplas identidades concentradas em uma figura mítica. Como não é uma representação verossímil do brasileiro, Macunaíma ainda pode ser uma alegoria, mesmo com essa nova ideia de identidade.” Para Telê Ancona Lopez, professora emérita do Instituto de

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