Dossiê – Reflexões do cárcere

Dossiê – Reflexões do cárcere

Para o jornalista Otto Maria Carpeaux, Antonio Gramsci (1891-1937) “foi um mártir e quase um santo”. Nascido na ilha da Sardenha, região pobre da Itália, Gramsci estudou profundamente a realidade social de seu país e foi um dos fundadores do Partido Comunista italiano, permanecendo em luta contínua contra o nacionalismo conservador e posteriormente contra o fascismo de Mussolini. Engajado na divulgação de um novo ideário socialista, ajudou a criar também dois jornais importantes, o Ordine Nuovo e o L’Unità. O ímpeto totalitário não demorou a lhe dar uma resposta. Gramsci foi preso pelo regime em 1926 e solto três dias antes de sua morte, em 1937, devido a uma tuberculose em estágio avançado. Em janeiro de 1929, recebeu uma autorização para escrever na cela. Desse período, resultaram os Cadernos do Cárcere, sua obra principal: um conjunto impressionante de escritos sobre política, história, cultura e filosofia.

Hoje, os conceitos criados por Gramsci circulam tanto em artigos acadêmicos especializados quanto nas páginas dos cadernos de política e cultura da imprensa diária. “Estado contra sociedade civil”, “intelectual orgânico”, “hegemonia” são expressões que pertencem ao léxico contemporâneo da teoria política. Mas, por isso mesmo, os escritos de Gramsci não ficam isentos dos reducionismos que toda obra de grande divulgação, principalmente aquela voltada à prática política, geralmente enfrenta.

Procurando desfazer os mitos em torno de suas ideias, o Dossiê desta edição busca esclarecer os pontos centrais do pensamento de Gramsci, decisivos para entender inclusive o atual jogo de forças políticas. Nesse sentido, Alvaro Bianchi apresenta a influência de Marx e Maquiavel na concepção política de Gramsci; Giorgio Baratta, presidente da Sociedade Internacional Gramtsci, na Itália, fala sobre as consequências da noção de cultura; Ruy Braga descreve a originalidade da reflexão sobre o American way of life; Rosemary Dore analisa o projeto gramsciano para a educação; Lincoln Secco traz a interpretação daquilo que deveria significar a filosofia da práxis segundo Gramsci; e, por fim, Carlos Nelson Coutinho resume, em entrevista, como se deu a recepção das ideias do autor italiano no Brasil.

Retomando Otto Maria Carpeaux, “a recordação de Gramsci deve ser igualmente cara a todos os que reivindicam a verdadeira democracia, contra as hipocrisias do elitismo. Sua obra de grande intelectual – um dos maiores do século 20 – inspira respeito até aos adversários do seu credo”. Afinal, a vida e a obra do marxista sardo converteram-se nos símbolos de uma “resistência inquebrantável nos cárceres mais escuros” de toda e qualquer tirania.

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