“Confiscação”, de Marie-José Mondzain, e outros lançamentos

“Confiscação”, de Marie-José Mondzain, e outros lançamentos

 

 

No título de sua obra, a filósofa franco-argelina Marie-José Mondzain já dá o tom do que se segue: trata-se de refletir sobre a confiscação das palavras e os usos que se fazem delas, pensando em novas perspectivas para termos desgastados como “radicalidade” e “radicalização”. Nesse sentido, como escreve Marc Berdet na orelha do livro, a filósofa “convida a juventude, interpelando-a: vocês têm todo o direito de ser radicais, isto é, de mobilizar sua sede de ideal, seu desejo de mudar o mundo, sua fonte de imaginação e de invenção de sentido”. No centro de seu pensamento, gravita a urgência de lutar contra a confiscação de palavras, imagens e do tempo, pois, submetidos que estão às leis do mercado globalizado, tais conceitos vão desaparecendo e ameaçam, por fim, nossa própria capacidade de ação.

Reunião de textos que a jornalista, escritora e ativista Bianca Santana publicou entre 2017 e 2022. Seus temas são os que apareceram nos noticiários brasileiros no período, como a crise sanitária, a reação do governo à pandemia de covid-19, a situação dos povos originários e as constantes ameaças às suas terras e a disputa em torno da PEC das Domésticas. Apesar da contemporaneidade de todos os assuntos, Bianca Santana sempre os pensa a partir dos processos históricos, sociais e políticos brasileiros, colocando em perspectiva as continuidades do passado colonial. O título da obra faz referência a duas plantas relacionadas às religiões afro-brasileiras, que se tornaram símbolos de resistência à máquina colonial. Ao evocá-las no título de sua obra, a jornalista pensa em sua significação no mundo contemporâneo, como formas de imaginar a democracia a partir de certa ética e política comuns às populações que sempre resistiram no Brasil. Para Edson Lopes Cardoso, que apresenta a coletânea, a escrita de Bianca “acompanha de perto os esforços sociais e comunitários, bem como as estratégias para a construção de redes mais orgânicas, encampadas por mulheres e homens negros empenhados em mudar as coisas injustas e desumanas da sociedade brasileira atual”.

Como anunciado no título, a nova obra da filósofa estadunidense Judith Butler propõe “desfazer” o conceito de gênero como único parâmetro para pensar a situação política das chamadas “pessoas dissidentes de gênero”. No conjunto de textos reunidos na obra, Butler passa por importantes temas do debate contemporâneo de gênero, como sexualidade, formas de família e parentesco, diferença sexual binária entre “homem” e “mulher” e direitos das pessoas trans. Nas palavras da autora, “estes ensaios também são sobre a experiência do vir a se desfazer, no bom e no mau sentido. Algumas vezes, uma concepção normativa de gênero pode desfazer nossa pessoalidade, sabotando nossa capacidade de perseverar em uma vida vivível. Outras vezes, a experiência de uma restrição normativa sendo desfeia pode desfazer a concepção prévia do quem se é, inaugurando, de maneira inesperada, uma concepção relativamente mais nova que tem, como objetivo, uma visibilidade maior”. Para Carla Rodrigues, que coordenou a tradução coletiva do livro e assina o texto de orelha, “esse caldo de cultura sobre a inteligibilidade e o reconhecimento começa a se formar na obra de Butler desde o seu início, ainda nos anos 1980, e desemboca aqui como síntese de muitos dos debates provocados por ela”.

Ana Martins Marques, Roland Barthes, Jorge de Lima, Walter Benjamin, Clarice Lispector e Alejandra Pizarnik são algumas das referências que pontuam o segundo livro de poemas da escritora goiana Fernanda Marra. No poema homônimo ao título, penúltimo da obra, a autora parte da imagem de um Trypanosoma cruzi, agente causador da doença de chagas, para ponderar sobre as diferentes escritas: “do hóspede da carne/ da sujeira da taipa/ da químio no bri(lh)o/ e da agulha no tecido”, evidenciando a polissemia mobilizada por sua escrita poética, já evidenciada nas diferentes camadas e sentidos que compõem o neologismo “taipografia”. Para Miguel Jubé, na nota editorial à obra, a poeta “transita entre diversos pontos de divergência e dali retira a sua convergência, sem se ater a uma desconstrução desmedida típica dos tempos presentes e que parece será limada pelo fantasma da história!”. “Colocada em dois eixos – poesia brasileira contemporânea e poesia produzida por mulheres -, Fernanda Marra não deixa de representar parte do melhor que se tem”, complementa Jubé, “com uma força que vai além de qualquer estereótipo ou lugar de fala a esmo.”

Por meio de entrevistas e uma exaustiva apuração dos acontecimentos políticos nacionais desde 2013, a jornalista carioca Consuelo Dieguez traça um panorama da nova direita brasileira, com especial atenção aos bastidores que levaram o então deputado federal Jair Bolsonaro à presidência da República. Em sua narrativa, ressaltam-se as dinâmicas e estratégias da nova direita, assim como as ideias de seus personagens, que aparecem por meio de entrevistas e perfis de empresários, militares, ruralistas, evangélicos, políticos e eleitores conservadores que apoiam Bolsonaro.

 


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