“A suspensão de Tomie Ohtake”, de Letícia Miranda, e outros lançamentos
Formas, cores, traços, luzes, linhas e fissuras atravessam os poemas de Letícia Miranda, em composições de cenas, desenhos e lampejos que ecoam o trabalho da artista plástica evocada pelo título da obra. Como coloca no poema “Duas gentes, um prisma”, na linha de suspensão provocada por Ohtake é “como se o mais urgente/ fosse o amarelo, o azul, o vermelho, o preto, o branco,/ o cinza/ como se tudo de mais efervescente/ fossem as cores”. Ou, em referência às esculturas da artista, fala em “Mulher-matéria” que “Majestosa é a mulher/ que primeiro lapidou/ o aço”. Como escreve Danielle Magalhães na orelha da obra, “a suspensão, matéria-prima de Ohtake, é também a matéria-prima da invenção de Letícia Miranda, que não só escreve sobre Ohtake e para Ohtake, mas escreve, inventa, ficcionaliza uma nova Ohtake”.
No romance de estreia do escritor paulistano, acompanhamos a trajetória de Nico em uma viagem de ônibus de São Paulo para Brasília. Apesar da aparente amenidade da travessia, pontuada por interações com os outros passageiros e uma nova amizade com a companheira de viagem, Nico é perpassado por sentimentos turbulentos e inquietações, tomando consciência da instabilidade de suas convicções até então. Dessa maneira, o leitor acompanha, paralela à travessia interestadual do protagonista, sua viagem interior pelos recantos de sua paisagem mental também em deslocamento.
Por meio de álbuns de família de Freud, cartas, fotos e documentos inéditos, o autor adentra as nuances da história da psicanálise e revela alguns de seus aspectos pouco conhecidos. Apesar de partir da vida privada de Freud, Luiz Eduardo Prado de Oliveira não deixa de apreender aspectos mais gerais, como o contexto social, político e estético que gravitavam o pai da psicanálise e viriam a dar as colorações da disciplina criada por ele. Com o apoio de Marta Raquel Colabone, a obra entretece, assim, as figuras que estavam ao redor de Freud com seus escritos teóricos, de maneira a “humanizar Freud para melhor fazer uso de suas descobertas”, como escreve Vera Iaconelli na apresentação do livro.
Psicanálise, arte, poesia, linguística e antropologia são algumas das áreas do conhecimento que Eliane de Christo mobiliza para refletir sobre os silêncios e violências que, por muito tempo, imobilizaram e cercearam as vozes das mulheres. Nesse movimento, a autora instaura uma ética que legitima a voz daquelas a quem era negada a voz, “para que mulheres digam de si, escolham os próprios silêncios e se autoproclamem, para além de inscrições de corpos, dores e cicatrizes”, como escreve Amanda Mont’Alvão Veloso na quarta-capa da obra. Para Viviane Veras, que assina a orelha do livro, trata-se de uma “escrita do desejo”, fabricada “entre o vislumbre subversivo das letras desenhadas no quadro negro da professora, o eco ritual das recitadas rezas da avó […] e as falas abusadas das meninas da boca mal dita”.
Com um forte tom humorístico, que nem por isso deixa de lado a ternura, o livro de crônicas de Tiago Maria percorre diferentes temas, como a vida na cidade, a convivência familiar e as referências literárias e intelectuais do autor, em um passeio pelas palavras pontuado por reflexões líricas descomprometidas. Pelos eixos temáticos que dividem as crônicas – “Nonsense”, “Infância”, “Sexualidade”, “Linguagem” e “Cidade” –, já se vislumbra a importância de suas memórias e experiências pessoais na composição das crônicas que, por isso mesmo, transitam entre diferentes gêneros. O título da obra faz referência ao próprio desejo expresso em seus textos: o “desejo constante de, sem tentar superar a vergonha deixando tudo para trás, ao contrário, vivê-la intensamente para dela sair mais humano”, registra Nathalia Protazio no prelúdio do livro.