Zé de Abreu, autoproclamado presidente da República

Zé de Abreu, autoproclamado presidente da República
(Foto: Divulgação/Twitter José de Abreu)

 

Uma questão de estilo, mas não só

Zé de Abreu, autoproclamado presidente da República é a boa notícia da semana. A palhaçada destruiu o Brasil, quem sabe a arte venha a salvá-lo. Essa performance em tom de brincadeira é a primeira atitude realmente desconstrutiva do governo que chegou ao poder pelo método das fake news e lá continua devido ao fracasso das instituições que deveriam assegurar a democracia e seus valores, como a verdade, mas que ficaram inertes diante de uma eleição fraudada em seu princípio fundamental de honestidade para com o povo. Uma eleição pautada na mentira produzida em um ritmo alucinante deveria ser anulada, mas os donos do poder não o fazem porque há interesses pessoais e estrangeiros nesse processo. Assim como a Venezuela possui as maiores jazidas de petróleo do mundo, o Brasil não está sendo esquecido com o pré-sal e outras riquezas naturais. A guerra híbrida no Brasil, disfarçada de processos judiciais sem provas, divulgação de mentiras e produção de políticos que agem como fantoches dos detentores do poder econômico mundial não é muito diferente da invasão militar de um país disfarçada de ajuda humanitária. Envolver o Brasil em um conflito com a Venezuela é matar dois coelhos com uma cajadada. O lance mais inteligente que os estrategistas de guerra poderiam produzir.

E por falar em palhaçada e arte, creio que todos estão atentos à dimensão estética desse governo caracterizada pelo Ridículo Político, fenômeno sobre o qual falei tantas vezes e cheguei a escrever um livro, que, hoje, alguns apontam como profético. Em apertada síntese, pode-se dizer que quem gosta do ridículo não gosta de arte. E há gente incomodada com a brincadeira do ator Zé de Abreu, aliás, um grande ator. São os defensores do bolsonarismo ou os que sucumbiram à depressão cívica ou, ainda, os ingênuos que acham que vai dar pra falar sério sobre o governo do fascismo tropical que devora o país. Mais do que nunca é preciso resgatar a comédia, a arte do riso que vem sendo amaldiçoada no Brasil. O Ridículo Político está em seu ápice, pior realmente não pode ficar, e o mau-humor toma conta. Só a comédia verdadeira poderá salvar o país. Lembrem da função política da comédia de Aristófanes a Molière. A comédia pode até ser considerada meio chata para os que defendem o caráter edificante da arte, mas ela é infinitamente mais desconstrutiva do que a tragédia, pensemos…

Certamente quem se incomoda com a brincadeira de Zé de Abreu são os mesmos que apoiam o tal ministro da educação, a ministra das mulheres, o ministro do turismo, o ministro do meio ambiente e outros que competem entre si para ver quem é o mais ridículo, porque só pode ser uma competição no Hospício Geral que virou o Brasil. O ridículo veio a se tornar um capital que levou Bolsonaro a se transformar de figura patética a idolatrada irracionalmente. Mas o ridículo já era uma mutação da cultura política e agora ele parece ter evoluído para a demência como estilo.  Falo em estilo, porque não estamos tratando de nenhum tipo de realidade ou verdade, que não estão em jogo nesse caso. Trata-se apenas de um aparecer, de um modo de se apresentar. Lembremos que o Brasil levado a sério tem um dos movimentos antimanicomiais mais importantes do mundo, com políticas de saúde mental paradigmáticas. Não é à toa que esse movimento vem sendo atacado desde o golpe de 2016, e que já no começo de fevereiro tenha havido “mudanças” na política nacional de saúde mental, com o retorno de manicômios e autorização para eletrochoques, algo que nos faz pensar em como é fácil produzir retrocesso em termos humanos.

Lembrei do sem noção mega blaster que resolveu lançar contra a criançada acostumada a dançar funk na escola a ordem de ouvir o hino, e que mandou alguém filmar para ter certeza que os meninos seguiriam a ordem abestalhada, produzindo propaganda para o governo que promete militarizar a sociedade. Desculpem os adjetivos, mas eles resumem muita coisa em um pequeno texto despretensioso como esse. Com a medida estúpida, como não poderia deixar de ser, e coerente com o estilo que vem sendo impresso pelo governo por meio de seus atos patéticos, o governante tenta ganhar tempo, pois não sabe o que fazer com crianças e jovens, mas consegue fazer o que há de pior pela educação: enganar. Engana as crianças que deveriam cultuar o país que as trata mal, engana que quer acabar com a “ideologia” nas escolas enquanto propaga as ideologias mais rasteiras. A verdade, como já disse, nunca esteve em jogo nesse governo: professores com salários de fome, estudantes pobres sem livros ou material escolar, sem merenda em escolas também fisicamente sucateadas.

Há esperança.  Os meninos que hoje desvalorizam a escola porque aderiram a uma desvalorização que vem da própria cultura capitalista, talvez venham a entender por linhas tortas que a escola é importante. As crianças e os jovens não são imbecis como os bozonazis de plantão querem que sejam. Como resposta democrática a uma medida autoritária, surgem coreografias em que o funk é a nova melodia para o hino nacional. Zé de Abreu representa uma resposta desse tipo. Se soubermos aproveitar, pode ser perigoso para os que confiam no autoritarismo, que precisa da burrice, da mistificação e do mau humor para se manter onde está.


Leia a coluna de Marcia Tiburi toda quarta-feira no site da CULT

(9) Comentários

  1. Não falem mal dos palhaços!
    ” A palhaçada destruiu o Brasil, quem sabe a arte venha a salvá-lo. ”

    Chamem esses canalhas de canalhas, que é o que eles são!

  2. A bioquímica do bolsonismo é o que de pior esse país produziu nos seus descaminhos históricos; você juntar num tacho a fogo alto: a anti cultura, a anti arte, a anti educação, a anti ecologia, a anti ética, o milicianismo, o militarismo, o banditismo corporativo, a aberração evangélica reacionária de mercado e o ultra liberalismo neo escravocrata…Pois é, a ignorância convicta das maiorias é a desgraça desse país, se não subir o nível de discernimento e de intelectualidade das massas não haverá salvação possível para o Brasil, vai ser a eterna casa grande senzala travestida de “democracia representativa”…Nosso povo foi formatado historicamente e propositalmente no servilismo, na alienação, no messianismo e no fanfarronismo, prefere desprezar seus iguais a se insurgir contra as elites políticas, corporativas e econômicas…Somos um dos países mais violentos e corruptos do mundo, e um dos mais alienados, estamos numa encrenca imensa, pois não dá para contar com as instituições de poder e nem com a classe política corporativa, e o povo vive a deriva do $alve-$e quem puder…Na pós modernidade virtual líquida a verdade é criada de acordo com a conveniência de ocasião, a verdade é travestida para ser bombada nas redes e gerar um pensamento modelador de massas, assim se induz a preguiça intelectual, se pratica a dominação geopolítica e ao mesmo tempo fomenta a rampeiragem cultural…!!

  3. Maravilhoso texto! Está com toda a razão! Eu compreendi e procurei transmitir para vários amigos e amigas da importância da atitude do Zé de Abreu (desde já, o Presidente do Brasil que eu reconheço) como expressão de um foco de resistência, baseado não em antagonismo ao Desgoverno Impostor, mas em premissas próprias e sinceras, que precisam e merecem ser ditas: o bom humor, a esperança, a perseverança, o fino deboche, a defesa dos verdadeiros valores, da paz, do diálogo, da solidariedade, da educação, da cultura, da liberdade, da fraternidade, etc. Em tudo isso, fantasticamente o Zé de Abreu sintetizou um dos últimos anseios latentes do povo brasileiro esmagado pela onda do Fake Governo: o de que ALGUÉM FALE – empoderadamente – EM NOSSO NOME.

    Um abraço!

  4. Excelente, Márcia!
    Contundente e com muito humor. O Ridículo Político é um ótimo conceito.
    Só mesmo deixando claro essa palhaçada que na verdade é a estética usada para fazerem atrocidades.
    Bjs.Quinet

  5. Grande sacada, Marcia! Todo apoio ao recém empossado Presidente e bora turbinar o programa de governo com a mais revolucionária de todas as armas: ALEGRIA , ALEGRIA!

  6. Olha meu querido vcs estao falando em salários de professores defazados não é culpa do novo presidente ele está aí pra concertar a merda que vcs esquerdIstá fizeram em quatorze anos e os roubos e rombo q tivemos petrpbras

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