Historiadora ganense cria repositório cultural do continente africano

Historiadora ganense cria repositório cultural do continente africano
A historiadora, curadora e cineasta ganense Nana Oforiatta Ayim, criadora do Cultural Encyclopaedia (Divulgação)

 

Nana Oforiatta-Ayim tem um projeto ambicioso. Desde 2016, a historiadora, curadora e cineasta ganense trabalha na formulação de uma grande enciclopédia cultural pan-africana, a Cultural Encyclopaedia. A intenção é reunir e catalogar a arte, a cultura e o pensamento – histórico e contemporâneo – produzido pelo (e sobre) o continente.

Um trabalho hercúleo, sem data de conclusão, mas que Oforiatta entendeu que “precisava ser feito” por volta de 2009, quando iniciou um doutorado em Linguagens e Culturas Africanas na Escola de Estudos Orientais e Africanos, na Universidade de Londres.

Durantes as muitas horas de pesquisa e biblioteca, ela esbarrava na produção de dezenas de pensadores, filósofos e artistas africanos “brilhantes”, quase sempre desconhecidos, que estudavam desde a arquitetura do norte de Gana no século 18 à Teoria do Caos – e sobre os quais havia pouca ou nenhuma informação online, de fácil acesso, disponível.

“Há tanto conhecimento sobre o continente africano, mas a menos que você pesquise a fundo não consegue encontrar”, explica Oforiatta à CULT na sede do Instituto Goethe em Salvador, durante o seminário internacional Ecos do Atlântico Sul, do qual foi uma das conferencistas. “Quis criar um espaço em que esses nomes pudessem dialogar entre si e com leitores em potencial.”

No site, curado por ela e outros 16 colaboradores, é possível navegar por 14 categorias – entre antropologia, política, teatro, sociologia, moda, arquitetura etc -, e encontrar verbetes sobre pensadores e artistas, sumários de teses e livros, documentos, trailers de filmes e ensaios fotográficos.

Sempre em construção, a plataforma pretende ser mais um mapa de referências capaz de “facilitar o (re)ordenamento do conhecimento, das narrativas e das representações do e sobre o continente africano” do que uma plataforma definitiva. Eventualmente, o site deverá se transformar em uma espécie de Wikipedia, aberto para que os próprios usuários publiquem e editem conteúdos.

Por enquanto, o projeto – que recebeu um aporte de 40 mil dólares do Museu de Arte do Condado de Los Angeles em 2015 – existe apenas na internet, mas a ideia é que também sejam publicados 54 volumes impressos dedicados à produção artística e intelectual de cada país, começando por Gana, terra natal de Oforiatta. Ela prevê que este primeiro livro seja finalizado em 2019.

“Em 2011, viajei de Lagos [Nigéria] até Addis Ababa [Etiópia] com um grupo de fotógrafos para investigar realidades e produções culturais locais”, conta, referindo-se ao projeto Invisible Borders, “e eu realmente tive que cavar essas histórias. Então pensei que deveria haver um livro que, mesmo que não desse todo o caminho, indicasse algumas direções”.

A essa altura ela seu projeto não era impossível de se realizar. É que naquele mesmo ano saía o livro African metropolitan architecture, no qual o arquiteto (e amigo de Nana) David Adjaye documentou, durante viagens que fez aos 54 países africanos, a arquitetura do continente. “Eu trabalhei com ele nesse livro, então sabia que era possível uma pessoa fazer esse tipo de trabalho enciclopédico, porque ele fez isso em dez anos”, conta.

O Cultural Encyclopedia também já existiu como exposição de arte. A primeira abriu em 2017 na capital de Gana, Acra, em um espaço de arte sem fins lucrativos chamado ANO, fundado em 2002 pela própria Nana. A mostra incluiu fotografias históricas da formação de Gana, vídeos e objetos coletados em Accra durante a primeira expedição do Mobile Museum, uma espécie de museu móvel que percorreu dez regiões africanas a partir de 2016 em mais uma iniciativa organizada por Nana.

“Muitos dos museus do Ocidente reúnem coleções de aventureiros ou de descobridores que iam a outras terras e traziam de volta objetos do outro. Isso é muito problemático”, critica. Os projetos e ações de investigação e preservação cultural da curadora costumam partir desse lugar da reorganização de narrativas e da descolonização dos saberes. Para a sequência de 54 enciclopédias impressas, ela planeja contar com outros times de editores em diferentes países – e, até agora, já há equipes em 22 deles.

(1) Comentário

  1. isso é a melhor que um ser humano pode dar para o seu continente,agradecido do fundo do meu coração.

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