O mal dito das partes

O mal dito das partes
Jean-François Lyotard durante vernissage de Les Immatériaux, 26 March 1985 (reprodução / Centre Pompidou)
  Há um regime expressivo capaz de dar conta dos fluxos, daquilo que não cessa de não se conter? Ou, em outros termos: quais usos da linguagem podem nos permitir tratar do gozo? Tratar do intratável, abordar aquilo que transborda, apreender e dar consistência a algo que escapa: eis algumas maneiras de indicar uma questão à qual o pensamento de Jean-François Lyotard retornou em diversas ocasiões. E é ainda um problema central em seu projeto de uma economia libidinal, na medida em que as intensidades em movimento não se deixam decodificar a partir de princípios estabelecidos para a descrição do trabalho, dos investimentos, das trocas e da circulação. Uma primeira pergunta que pode surgir então é: o que haveria aí de propriamente econômico? E de libidinal? Comecemos por contextualizar rapidamente o projeto lyotardiano em Économie libidinale (1974), referenciando-o a um conjunto de críticas direcionadas à concepção clássica de economia que aparece no século 18 e que deriva de um axioma fundamental: o de que a ação social no campo produtivo pro­cede de um cálculo racional pautado nos interesses individuais. Essa racionalidade instrumental pode ser aplicada a diversos âmbitos da vida, orientando sempre a conduta para estratégias de maximização do lucro. Torna-se, portanto, um princípio abstrato de inteligibilidade da ação, intimamente vinculado ao primado valorativo que a propriedade privada passa a ter e que sustenta o papel social que a mercadoria assume, os espaços e modos de organização do trabalho etc. Sabemos como crítica

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