Inatualidade e atualidade de Montaigne: duas notas

Inatualidade e atualidade de Montaigne: duas notas
'Presunção', por Salvador Dali (Arte Andreia Freire)
  I – Jean Starobinski, ao relacionar o movimento do pensamento de Montaigne à geração seguinte, escreveu, em Montaigne em Movimento: “E quando, em Descartes, o instante montaigniano do eu sinto se tornar o instante em que se impõe a certeza intelectual do eu penso, a evidência subjetiva se tornaria o ponto de partida de um método que confiará nos cálculos, na geometria, para explicar mecanicamente todas as manifestações da substância extensa; abre-se um futuro para a ação previsível”. Como se sabe, desde então até os nossos dias, a ideia de progresso e previsibilidade se tornou dominante na ciência e na filosofia. Este ponto significou, em relação aos ensaios de Montaigne, a redução do seu pensamento a um lugar “regressivo” e progressivamente inatual. Esta inatualidade se tornará, três séculos depois, uma das fontes do seu encanto para pensadores do final do século 19, principalmente Nietzsche. Aqui será preciso assinalar o significado do advento do pensamento psicanalítico a partir da publicação da Interpretação dos sonhos por Freud em 1900. Em 1923, com O Eu e o Id, verifica-se uma reviravolta na maneira como o “eu” passa a ser concebido, seja em sua origem corporal, seja em função de suas dependências das determinações inconscientes, o que implicou uma crítica explícita ao primado da consciência e, portanto, do sujeito. Este é o ponto de contato principal entre o pensamento inatual dos ensaios, no que se refere à mobilidade do “eu” e à sua ancoragem na experiência corporal, e sua inequívoca atuali

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