Fotógrafa pioneira, Anna Atkins passou mais de um século na obscuridade

Fotógrafa pioneira, Anna Atkins passou mais de um século na obscuridade
A botânica inglesa Anna Atkins (1799-1871), considerada a primeira fotógrafa do mundo (ReproduçãoArte Revista CULT)

 

 

Enquanto seus contemporâneos homens davam os primeiros passos na fotografia, a botânica Anna Atkins já estava na frente, pensando no potencial de compartilhamento e didatismo das imagens. Usando a cianotipia, uma antiga técnica fotográfica, ela criou e publicou o primeiro livro ilustrado com fotografias da história – um guia botânico que trazia imagens de algas que ela mesma coletava e fotografava.

Em dez anos de atuação, Atkins capturou mais de dez mil imagens sem sequer usar uma câmera, confiando apenas na própria intuição para controlar o tempo de exposição de suas criações. Por isso, a inglesa é considerada a primeira fotógrafa mulher do mundo – embora sua contribuição para a arte só tenha sido resgatada em 1970.

Nascida na Inglaterra pouco antes do início da Era Vitoriana, em 1799, Atkins foi uma mulher privilegiada: seu pai, o químico John George Children, acreditava que a filha fosse capaz de realizar qualquer atividade, independentemente do gênero.

Ao contrário da maior parte das famílias da época, que criavam meninas exclusivamente para o casamento, Children incentivou a filha desde cedo em seus interesses por plantas e animais, e inclusive pedia com frequência que ela ilustrasse seus trabalhos científicos com desenhos ricos em detalhes.

Chordaria flagelliformis de Anna Atkins
‘Chordaria flagelliformis’, por Anna Atkins (Reprodução/Livraria Pública de Nova York)

Em 1842, Children apresentou a Atkins a cianotipia, um processo de captura de imagens que daria origem à fotografia moderna. Não é necessário o uso de câmeras: na cianotipia, espalha-se num papel alguns materiais sensíveis à luz, e coloca-se sobre a mistura o objeto a ser fotografado. Como resultado, as partes sem o objeto são sensibilizadas pela luz e tornam-se azuis, enquanto os locais do papel em que o objeto fez sombra permanecem brancas, capturando seu contorno.

Atkins aprendeu o método sozinha, e se tornou especialista em julgar a quantidade de luz necessária para fotografar algas e plantas que ela mesma colhia. Desapontada com a falta de ilustrações no maior guia de algas britânico publicado até então, ela percebeu que a técnica poderia servir à ciência, e passou o ano seguinte fotografando e catalogando todas as algas que o guia apresentava.

Por conta própria, ela publicou o livro Photographs of British Algae: Cyanotype Impressions (1843), um volume escrito à mão e ilustrado com 307 cianotipias das mais diversas algas britânicas, que acabou se tornando a primeira publicação do mundo ilustrada com fotografias.

Entre 1843 e 1853, Atkins trabalhou na criação de fotografias para ajudar seus colegas da botânica em seus estudos, e chegou a publicar mais dois volumes de seu Photographs of British Algae, dos quais hoje restam 17 cópias, todas com enorme valor – em 2004, uma delas, com 382 fotografias foi vendida em um leilão por 229.250 libras (cerca de 974.312 reais).

Pouco antes de morrer, em 1865, a botânica doou seu herbário para o British Museum – e faleceu sozinha, sem grandes reconhecimentos. Hoje, porém, o  livro pioneiro de Atkins é destaque de uma exposição retrospectiva sobre fotografia do século 19, no Rijksmuseum, em Amsterdam. “Dado que 170 anos mais tarde, artistas ainda usam os mesmos processos aperfeiçoados por Atkins, podemos dizer que sua obra é atual”, disse ao The Guardian o curador da exposição, Hans Rooseboom.

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