Do reaça básico e da sua luta épica contra o comunismo
Cartazes anticomunistas brasileiros da década de 1960 (Reprodução Arte revista CULT)
Há de haver reaças de todos os níveis no Brasil hoje, mas o nível básico eu já identifiquei: o cara fala de Cuba como se estivéssemos no auge da Guerra Fria e apavorados com a possibilidade de internacionalização das revoluções socialistas; ou fala de “bolivarianismo” como se estivéssemos de sentinela um dia antes da Revolução Chinesa de 1949 e Nicolas Maduro fosse uma espécie de Mao Tse-tung venezuelano.
O reaça primordial orienta a sua paixão política por ser contra o comunismo e não adianta lhe explicar que está lutando contra espantalhos, uma vez que a sua ideia de comunismo e socialismo é completamente nebulosa e imprecisa. Para ele, o comunismo tem vagamente a ver com o ser de esquerda, gostar de bandido, mostrar gente pelada em exposições, marcha das vadias e com o regime político de uma Coreia aí – só não sabe qual delas.
No estado de alucinação anticomunista em que se encontra o reaça elementar, nós estamos em 1962 e a União Soviética, subvencionada pelo BNDES, está prestes instalar mísseis na Ilha e tomar a América Latina. E acabou-se de descobrir um túnel que sai da sede do Foro de São Paulo e vai dar no Kremlin na época do socialismo soviético.
Em 2014, o reacinha básico mandava, pelo WhatsApp, vídeos de Maduro regozijando-se com a vitória de Dilma, a que acrescentava a aguçada observação: “A situação do Brasil é mais GRAVE do que maioria pensa”. Mandava, pelo Twitter, uma foto de menininhos com uma bandeira cubana no acampamento do MST e acrescentava um apelo urgente: “Mande isso para 50 pessoas para evitar que esta seja a última eleição brasileira”. O reaça fundamental até frequentou as classes de História, mas as usou para fazer uma colagem, sem gramática nem coerência, acerca da grande ameaça comunista que ronda a Galáxia e que se infiltrou no Brasil pela mão de Lula, Dilma, o PT e o Foro de São Paulo.
Em 2018, o reacinha fundamental “descobriu” que a ditadura militar não foi ditadura, mas a forma institucional com o que os defensores da pátria impediram que o Brasil se tornasse… Uma ditadura. Comunista. Vocês pensam que enganam o reacinha elementar, mas ele também descobriu “na internet” que o nazismo era um regime comunista, que Hitler era de esquerda, e que o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães não era, na verdade, da extrema-direita, mas uma espécie de PSOL dos anos 1920 aos anos 1940.
Informado de que esta é uma impossibilidade histórica e de que a verdade é o contrário disto, que os comunistas e socialistas alemães foram dos primeiros a serem mortos e condenados pelo regime nazista, o reacinha básico responderá com um sorriso maroto e condescendente, apiedado do fato de que você sofreu doutrinação ideológica do seu professor esquerdopata de História. “A Escola Sem Partido vem aí”, dirá, com compaixão, para dizer que a nossa ignorância não é incurável.
O reacinha primitivo decidiu agora que que ir morar em Portugal. Tirou férias por lá (ou soube de alguém que por lá passou) e viu que nas rodovias os carros não trepidam nem desviam de buracos, na frente dos supermercados ninguém avisa que vai vigiar seu automóvel, as pessoas são educadas, limpas, prósperas e falam português – ou algo muito próximo. O reacinha básico não sabe que Portugal é governado pela esquerda moderada apoiada pela esquerda radical, que lá o aborto não é crime e que em suas escolas se ensina tudo o que a “Escola Sem Partido” quer proibir em Pindorama.
Informantes secretos da Internacional Comunista em Portugal inclusive me informaram que por lá ensinam que o nazismo era de extrema-direita, que existe aquecimento global e que, para minha surpresa, os portugueses continuam insistindo que a Terra não é plana. Mas é melhor não colocar pressão nas ideias do reacinha básico brasileiro com esses arcanos e tais invencionices. Fica sendo o nosso segredo, da confraria dos esquerdopatas anônimos.
Enquanto odeia a esquerda, os defensores dos Direitos Humanos e a propagação da “ideologia de gênero” que está destruindo a família, o reacinha básico se enche de badulaques chineses. Não, o reaça elementar não sabe que a China é um país comunista. Comunistas são Venezuela, Bolívia e, desde que o PT ganhou a primeira eleição presidencial, o Brasil – como todo mundo sabe. O reaça básico é muito esperto e saca tudo.
(2) Comentários
Que texto sensacional!
Vontade de mandar pra tanta gente esse texto. Excelente!