Uma impressão de Simone de Beauvoir
Simone de Beauvoir, Paris, 1948 (Foto Gisèle Freund/Reprodução)
Não espere o leitor que eu faça aqui uma resenha do primeiro volume d’A força das coisas. Teria de aborrecê-lo com dados enumerados em enésimos releases; lembrá-lo de que esse relato, composto a partir de anotações e documentos de época, fala do imediato pós-guerra. Pior: teria de oferecer-lhe um antegosto mais ou menos insípido de belas histórias de viagens; uma “França penitente”; “América”, diagnosticada nos sintomas de um mundo todo masculino e, por vezes, defendida contra aquilo em que estava se transformando; os relacionamentos da autora com Jean-Paul Sartre e os seus próximos – um lugar à parte para o escritor e amante Nelson Algren; a multiplicação de escândalos e mal-entendidos com a publicação de seus romances, O segundo sexo; mudanças de casa e nas maneiras de viver; um grão de transcendência colhido à sua reflexão sobre o fazer literário; imagens seletas de suas “manias”, perseveranças para tornar-se escritora.
Houvesse espaço para brincar com o título de suas obras, daria alguma notícia das metamorfoses de Simone de Beauvoir, de moça mais ou menos bem comportada até a sua morte algo suave, atravessando a força da idade, para interpelar leitores e leitoras e implicá-los pelos quatro cantos do mundo. Seria preciso ainda uma nota, como esta: sempre poderemos confiar na argúcia de quem a apelidou “Castor”, nome no qual caberia ressaltar, ladeando o trocadilho com o inglês, em “beaver”, o empenho laborioso no reino do animal-arquiteto, além da evocação buscada ao mito de dois jovens filhos
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