Por que o governo repassa menos de R$ 1 para a alimentação de cada estudante?
Por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), o governo federal repassou R$ 0,53 para a alimentação de cada aluno da pré-escola, e R$ 0,36 para cada estudante que está no ensino fundamental e médio.
Diante dos baixos valores repassados, aumento da fome e da inflação no país, uma rede de instituições escolares escreveu uma carta aos candidatos das próximas eleições pedindo pelo reajuste do orçamento para a alimentação escolar, de acordo com o jornal Folha de São Paulo.
A carta alerta que, em 2022, as escolas públicas têm de lidar com perda nutricional dos jovens em decorrência da pandemia e, mesmo assim, houve uma redução de R$ 3,96 bilhões no orçamento. Além disso, não teve reajuste significativo do peso nutricional desde 2010.
“A alimentação dos alunos é uma questão central. A escola é o equipamento público mais bem distribuído do país e tem sido a garantidora da qualidade da alimentação de novas gerações há décadas. De acordo com a lei, parte da merenda tem que ser comprada dos produtores locais, então também é um recurso muito volumoso de fortalecimento da agricultura familiar”, explica a socióloga Helena Singer, idealizadora do Movimento de Inovação na Educação, que apoia organizações voltadas para a educação básica brasileira que inovam em seus projetos políticos pedagógicos.
“Quando você diminui a merenda escolar, você está atingindo a segurança alimentar não só dos estudantes, mas também das famílias que vivem de vender produtos agrícolas para as escolas”, define Singer.
A volta da fome
Para se ter uma ideia do problema do repasse com valores tão baixos, basta pensar que o Pnae beneficia 40 milhões de alunos matriculados em instituições públicas de ensino no país.
Trata-se do reflexo da difícil situação do Brasil: hoje, cerca de 125,2 milhões de pessoas ou 6 a cada 10 brasileiros convivem com algum grau de insegurança alimentar. Em pouco mais de um ano, houve um incremento de 14 milhões de pessoas na condição de não ter o que comer todos os dias. É o que aponta o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, lançado na quarta-feira (8).
Qual é o projeto de educação?
“Não adianta falar de crise econômica como justificativa para a queda no valor da alimentação nas escolas quando você percebe que a educação não é tratada como prioridade ou investimento pelo atual governo. Basta ver qual foi a sua última proposta para a educação: o homeschooling (educação domiciliar). Uma pauta de costumes, que agrada seus apoiadores e nada tem de aprimoramento na qualidade do ensino ou estrutura para milhões de crianças e jovens de baixa renda”, afirma Jade Beatriz, presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundários (UBES).
“O atual governo tem um projeto de educação muito claro, que é coerente com a sua perspectiva fascista. É um projeto que tem uma teoria de superioridade de alguns sobre outros. Uma ideia de superioridade de raça e de gênero. E não há nenhum constrangimento do presidente e de vários de seus atores proferirem construções racistas, LGBTQIA+fóbicas, machistas. Então é essa visão que ancora as políticas de educação”, analisa Helena Singer.
“Com relação à educação básica, o papel prioritário do governo federal é orientar os programas indutores com relação ao currículo, formação de professores, materiais didáticos. E isso ele vem fazendo com as escolas cívico militares, o que é coerente com o projeto de violência necessária para implementar um ideal machista, racista, LGBTQIA+fóbico de nação. Você precisa de uma escola disciplinar onde os estudantes não têm o direito de se manifestar, se expressar, de investigar”, afirma Singer
A Cult procurou o Ministério da Educação, órgão responsável pelo Pnae, para comentar o repasse e as reinvindicações presentes na carta da rede de instituições, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem. Se o MEC responder, o posicionamento do órgão será acrescentado.