Antologia reúne a poesia do siciliano Salvatore Quasimodo

Antologia reúne a poesia do siciliano Salvatore Quasimodo

Heitor Ferraz

A poesia italiana moderna vem sendo pouco a pouco redescoberta no Brasil. Durante anos, eram poucos os italianos que podiam ser encontrados nas estantes das livrarias. Mais comum era encontrar belas traduções em suplementos e revistas, como as que fizeram tanto Haroldo de Campos como Ecléa Bosi de vários poemas de Giuseppe Ungaretti, um dos maiores poetas desse século e que nos anos 30 viveu em São Paulo, trabalhando como professor na nascente USP. As de Eugenio Montale também surgiram primeiro pelos jornais. As de Salvatore Quasimodo, só mesmo em sebo, na velha coleção dos Prêmio Nobel de Literatura, da editora Delta. Nos últimos anos, porém, a poesia italiana passou a circular, ainda que timidamente.

De Ungaretti, foram saindo vários livros reunindo seus ensaios e um volu­minho dedicado a Alegria, seu primeiro livro de poemas. Montale acabou nos deslumbrando com sua poética forte e imagética, às vezes belamente prosaica, na antologia preparada e traduzida por Geraldo Holanda Cavalcanti, publicada há dois anos pela Editora Record. E agora é a vez do siciliano Salvatore Quasimodo, prêmio Nobel em 1959, sair pela mesma editora, também com tradução de Cavalcanti e com apresentação da crítica italiana Luciana Stegagno Picchio. 

Nascido em Modica, província de Ragusa, em 1901, Quasimodo desen­volveu sua poética inicialmente sobre a influência do hermetismo. Como conta Stegagno Picchio, em 1929, em Florença, ele se ligou ao grupo da revista Solaria e no ano seguinte estreou com o livro Acque e terre. “Conhece, entre outros poetas, Montale e insere-se no clima rarefeito do hermetismo, do qual se tornará, junto com Ungaretti, um dos mais refinados representantes”, explica a crítica. Nesses seus poemas, há um nítido diálogo entre o homem de seu tempo e a natureza que o cerca. Em depoimento, Quasimodo analisa sua poesia como fruto de sua terra: “Meu limite é a Sicília; nela há antigas civilizações, necrópoles, latomias, telamões que se destacam na relva, minas de sal e de enxofre e mulheres que choram durante séculos seus filhos mortos, furores contidos ou desencadeados, criminosos por amor ou por zelo de honra.”

Em algum de seus belos poemas de sua primeira fase, como “Vento em Tíndari” e “As lembranças”, a Sicília é presença marcante. E muitas surgem como rememoração íntima, já que, como ele escreveu, “áspero é o exílio”. Em “As lembranças”, por exemplo, podemos ver o poeta deitado na Piazza Navona, no centro de Roma, olhando o céu. E já é outro o céu que ele sente: passa a ser povoado pelas “mesmas estrelas que seguia de menino/ estirado sobre os seixos do Platani/ silabando as rezas no escuro”. A natureza vai se infiltrando no homem: “A ti assemelho minha vida de homem/ fresca marinha que trazes seixos e luzes” (“Fresca marinha”).

Como conta Stegagno Picchio em sua introdução, a obra de Quasimodo nor­mal­mente é dividida em duas fases. A primeira foi a fase hermética; depois, nos anos 40, quando o poeta se encontrava traduzindo os líricos gregos, Catulo e outros textos clássicos, ele inicia uma nova fase, “aquela mais ligada ao real e ao com­promisso social”. A seleção feita por Caval­canti busca um equilíbrio na es­co­lha dos poemas de todas as obras do poeta siciliano. É, sem dúvida, uma boa intro­dução ao poeta do famoso verso “ed è subito sera” (“e de repente é noite”).

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