Pátria falastrona
(Foto: Marcos Santos/USP Imagens)
Para combater as desigualdades sociais e econômicas no Brasil é necessário criar riquezas e educar. Também é preciso, pois, educar para que se possa criar riqueza e saber distribuí-la da forma mais justa possível.
Até a metade do século 20, fazia sentido imaginar que, superando o modo de produção capitalista (aquele em que a busca da riqueza se faz em vista de seu crescimento contínuo), venceríamos um tipo tradicional de dominação para entrar numa era cujas liberdades seriam muito mais amplas que no passado. Nenhuma das revoluções desse período cumpriu essa promessa. Ao contrário, reforçaram o capitalismo de Estado e instalaram sistemas políticos autoritários.
Fazer política hoje implica, no fundo, enfrentar uma contradição: a criação e a distribuição mais justa da riqueza econômica dependem da produção capitalista, que por si mesma cria mais riqueza produzindo enormes diferenças de renda. Daí um novo sentido a ser conferido ao Estado: cabe-lhe assegurar as condições da produção capitalista, assim como intervir na sua distribuição marginal visando implementar justiça social. Até agora isso foi feito alternando-se períodos de desenvolvimento econômico e de estagnação, ambos no plano da economia e da política. Não haveria como sair dessa alternância perversa?
Mesmo sem mudar suas categorias elementares, o capitalismo do nosso tempo é muito diferente daquele do século 19. Desde David Ricardo e Marx sabe-se que os processos capitalistas de trabalho, porque são abstraídos para poder visar a uma taxa média de produtividade, dependem do progresso tecnológico. Progresso que deu saltos inacreditáveis nos últimos anos. Se os países que agora logram sair da crise de 2008 o fazem mediante revoluções tecnológicas, é porque o próprio desenvolvimento atual depende dessas revoluções. Não se pode cair na ilusão do capital financeiro e imaginar ser possível investir nos ramos produtivos sem visar a novas tecnologias que assegurem novas posições no mercado.
A extraordinária expansão do ensino que ocorreu nos últimos anos no Brasil por certo o democratizou, mas deixou de lado as agruras da formação técnica. Às vezes beira o ensino falastrão. Hoje se volta a valorizar o ensino técnico, mas a pesquisa tecnológica está desorganizada, a despeito de contarmos com grandes centros de excelência. Essa pesquisa abandonou a universidade, voltada sobretudo para promover ascensão social. Quantas vezes se ouve nos campi que a universidade não deve colaborar com o capital? Mas onde buscar a riqueza para socorrer a população mais pobre?
Acentuar a pesquisa científica e tecnológica implica criar diferentes programas, aproveitando as diferenças naturais de talento. Isso não pecaria por cair num execrável elitismo? Sem matizarmos nossas expectativas e nossos pensamentos, sem uma grande revolução no ensino, nosso desenvolvimento apenas se arrastará. E a integração social que ainda promove se tornará ilusão cinzenta. A pátria somente será educadora se for menos falastrona.
> Compre a versão digital do Dossiê “Brasil: Pátria educadora?”
> Assine a CULT digital e leia na íntegra todos os textos da edição 209
> Compre a edição 209 em nossa loja online