O massacre da especulação imobiliária atinge o Teat(r)o Oficina
A coluna Cena Contemporânea recebeu o Manifesto abaixo redigido por Zé Celso Martinez Corrêa a propósito de uma ameaça de descaracterização urbanística que o Teatro Oficina está sofrendo. Desnecessário dizer que São Paulo não precisa de torres residenciais consagradas pela especulação imobiliária; e sim de templos profanos devotados à arte, educação e cultura – como o que está instalado no número 520 da rua Jaceguai.
FOTOS Bob Sousa
Manifesto de Apoio aos atuadores do poder cultural e do Patrimônio que hoje decidem sobre a ameaça da Especulação Financeira sobre o BIXIGA y o Teat(r)o Oficina e seu Entorno
Há 58 anos o Teat(r)o Oficina cultiva a cultura no numero 520 da rua Jaceguay , no Bairro do Bixiga e seu entorno e há 34 anos luta contra o massacre predatório da especulação imobiliária no bairro do Bixiga, baixado no capital do grupo Sisan – empreendimento imobiliário, braço armado da especulação imobiliária do grupo Silvio Santos.
A partir de 2010 , quando o Teat(r)o Oficina foi tombado pelo Iphan, o próprio Silvio Santos colocou francamente a questão: Já q, a partir de agora, não podemos construir mais nada em nosso Terreno, eu não desejo empatar o trabalho de vocês, nem quero que vocês empatem o nosso; proponho a troca do terreno de propriedade do grupo por um terreno da união do mesmo valor. Diante dessa proposta, boa parte de representantes do poder público, deram início a uma articulação política para que a troca fosse feita e o terreno do entorno do teatro tivesse destinação pública e cultural. Neste mesmo ano, foi estabelecido um contrato de comodato entre o Grupo Silvio Santos a Associação Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona. A ocupação do Terreno teve início através de um Ritual Teatral: uma Tenda de 2.000 lugares para o Público foi levantada pra que se encerrasse a Temporada Nacional das “Dionizíacas 2010”, com a encenação de “Bacantes”,”O Banquete” e “Cacilda!!! Estrêla Brazyleira a Vagar”. Na Estreia ox atorexs y Público, em Cena no Nô Japonês “Taniko”, derrubaram os Muros do Beco sem Saída q limitavam a Pista do Teatro Oficina, Rua Lina Bardi, e atuando, descendo uma longa rampa, pisaram nas terras do Entorno Tombado pelo Iphan, de seu Entorno penetrando na Taba do Rito. Há 5 anos, o Terreno vem sendo cultivado e cultuado pelo Público nos Ritos Teatrais do Oficina Uzyna Uzona.
Mas, já, desde 2009, uma parte do grupo Silvio Santos vem tentando aprovar seu atual empreendimento imobiliário, torres residenciais, nos órgãos de preservação do patrimônio. O Iphan, órgão de preservação de âmbito federal, vinha impedindo a aprovação do empreendimento. Esta deliberação ganhou um prazo limite para o dia 22 de janeiro, caso contrário o Iphan está ameaçado de multa pelo grupo especulador, decidia no Ministério Público.
Diante da situação, o Iphan manifestou: não ter instrumento jurídico para barrar o empreendimento, mas hoje re-existe, convocando representantes do poder público aliados e diretamente envolvidos no processo de defesa do patrimônio cultural, sobretudo ligados aos movimentos da Troca de Terrenos do Entorno do Oficina, por um Terreno da União, para uma reunião nesta data limite da deliberação: hoje, 22 de janeiro. O Objetivo é criar uma estratégia, numa articulação conjunta dos órgãos de preservação do patrimônio federal (Iphan), municipal (CONPRESP) , secretaria municipal de cultura, ministério da Cultura, SMDU (secretaria de desenvolvimento urbano) para dar a única destinação possível para este último pedaço de terra do bairro do Bixiga: área demarcada pública, de uso estético, cultural, político e Ritual. As Terras do Oficina são terras demarcadas pelo próprio processo cultural teat(r)al nelas cultivado, permanentemente frorescente, em cada estação.
O projeto atual da SISAN encaixota o teatro e encerra o janelão de 100m² na escuridão com a proposta de um empreendimento imobiliário de impacto incalculável tanto na obra de arte feita por Lina Bo Bardi e Edson Elito – considerado, este ano de 2016, pelo The Guardian, como o melhor teatro do mundo –, quanto no Corpo de Artistas de Muitas Gerações que criaram esta Companía de Artistas de 58 anos, em Permanente Mutação Geracional, cultivando estas terras com uma revolução Teat(r)al.
Os órgãos de preservação alegam, à primeira vista, não terem instrumentos jurídicos para deliberar contra o empreendimento, mas claramente o projeto entope as ruas do Bixiga com uma frota nova de carros, descaracteriza o traçado original e tombado do bairro e assombra uma sobreposição de áreas envoltórias de bens tombados, formada pela Casa da dona Yayá, TBC Teatro Brasileiro de Comédia, Teatro Oficina, Vila Itororó e o conjunto de sobrados da rua Japurá.
A aprovação das torres certamente escancara, como nunca antes, o bairro do Bixiga para a entrada da especulação imobiliária, sobretudo porque o projeto vem aparelhado com o lançamento a toque de caixa de um edital para leiloar os baixos do viaduto Julio de Mesquita Filho, em frente ao teatro, e que rasga boa parte do bairro do Bixiga. O edital, parece que vindo da Prefeitura, entrega ao maior capital oferecido para explorar comercialmente os baixos do viaduto num projeto que nem sequer obriga a empresa vencedora do edital a conhecer o espaço do terreno; um movimento de capitalização voraz de qualquer terra pública que se aviste, como se toda terra precisasse se tornar lucrativa para atender ao que o poder publico chama de ‘revitalização’, levados pela paranoia econômica de que, diante do dito caixa zero dos cofres públicos, toda a sobra de espaço público que ainda re-existe em São Paulo precisasse ser entregue a iniciativa privada para o mercado ditar o destino das terras públicas e da cidade, colocando a cultura refém do capital.
Vamos trazer a presença de Azis Ab’Saber, o geógrafo q foi presidente do Condephat nos anos 80 e, ao mesmo tempo, tombou a Serra do Japí, o Teat(r)o Oficina e um Território Indígena em São Paulo.
Quando as pessoas que ocupavam cargos de proteção cultural diziam a ele que não tinham Poder, ele refutava com seu próprio exemplo, declarando que o Poder é de quem o exerce.
Em 2010, junto com o tombamento do Oficina pelo Iphan, outros dois tombamentos foram aprovados. Um deles protege 14 bens da imigração japonesa no Vale do Ribeira, em São Paulo – fábricas, igrejas, casas e até as primeiras mudas de chá Assam (preto) plantadas no Brasil, em 1935. Também foram protegidos dois lugares considerados sagrados por índios do Alto Xingu, no Mato Grosso – o Iphan atendeu a pedidos das etnias waurá, kalapalo e kamayurá. Os dois lugares, chamados Sagihengu e Kamukuwaká, fazem parte do Kwarup, a maior festa ritualística da região.
Mirando-nos no exemplo da atuação de Azis Ab’Saber, temos a certeza de que, hoje, os representantes do Poder do Patrimônio Cultural, Brasileiro e de São Paulo que se reúnem nesta Capital do Capital, encontre as medidas que impeçam que o Poder do Capital Especulativo, em nome de argumentos jurídicos, massacrem o Poder Cultural da Justiça, em si.
O Poder Político Humano dos que ocupam os Orgãos de Patrimônio referidos tem, no dia de hoje, o apoio de todos os que acreditam no Poder da Cultura, da Inteligência e da Criatividade Humana, nas equações mais ameaçadoras da Crise Econômica.
Antes de tudo, vivemos pra transmutar uma Crise que é sobretudo Cultural e Política, muito mais que econômica. Crise é momento de Criação de novos caminhos que o tempo exige.
Hoje a perspectiva que o poder público precisará ter é da Cultura e não do direito como paradigma da Política e o Teatro como Paradigma de Vida.
Assino em baixo:
José Celso Martinez Corrêa, 78 anos, presidente da Associação Teatro Oficina Uzyna Uzona
Para mais informações, acesse: https://blogdozecelso.wordpress.com/