O infamiliar da necropolítica em nossa vida cotidiana

O infamiliar da necropolítica em nossa vida cotidiana
Detalhe da tela “O triunfo da morte” (1562), de Pieter Bruegel, o Velho
  Em seu livro Histórias do sr. Keuner, Bertolt Brecht nos traz uma reflexão de fina ironia com o texto “Se os tubarões fossem humanos”. A história de Brecht se abre com a inocente indagação de uma menina: “Se os tubarões fossem humanos, seriam mais simpáticos com os peixinhos?”. A resposta é positiva e lança uma série de exemplos hipotéticos: os peixinhos teriam caixas muito organizadas para viver e desfrutar de vários benefícios de infraestrutura, teriam festas públicas “pois peixinhos alegres são mais gostosos que os tristonhos”, aprenderiam uma religião que ensinaria que a verdadeira vida começa na barriga dos tubarões, teriam na arte a representação do êxtase na figura dos dentes e da goela dos tubarões, aprenderiam geografia para chegar à boca dos tubarões mais preguiçosos. Keuner afirma que os tubarões naturalmente entrariam em guerra uns com os outros, guerras que seriam lutadas pelos seus peixinhos, óbvio. Mas eis a parte mais genial da história: “Os peixinhos são sabidamente mudos, mas eles se calam em diferentes línguas e, portanto, não conseguem entender um ao outro”. Cabe lembrar aqui a conjuntura em que o texto é publicado por um autor exilado de terras alemãs diante da ascensão de Hitler ao poder. Talvez nunca na história, de fato, a relação de continuidade entre cultura e morte foi tão explícita. O advento dos campos de extermínio foi um divisor de águas na história, pois mostrou, de forma inédita, o uso e o abuso de uma racionalidade a serviço de uma orquestração eficiente da morte em es

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