Necrobiopoder: maternidades periféricas contra o Estado

Necrobiopoder: maternidades periféricas contra o Estado
(Arte: Monique Malcher)
  Cena 1 Ano: 1871. Rio de Janeiro. Deputados federais disputam o destino dos/as filhos/as das mulheres escravizadas. Pela primeira vez na história do Brasil, o Estado pauta o tema da abolição (indireta) da escravidão. A proposta, encaminhada pelo imperador Dom Pedro II, decretava o fim da hereditariedade biológica da condição escrava. As mulheres escravizadas dariam à luz filhos livres. E elas? Continuariam escravizadas. Por meses, os parlamentares disputaram o destino do fruto do ventre das mulheres escravizadas. Um deputado diz: “Se a mulher é escrava, o fruto também o é”. Outro: “Como vamos aceitar em nosso meio uma turba selvagem, sem educação, sem religião?”. Um terceiro completa: “Sabemos, nobres colegas, que a mulher escrava cumpre dupla função, como força de trabalho e como reprodutora”. Se os/as filhos/as eram separados/as da mãe para serem vendidos/as nos mercados, com a nova lei (Lei do Ventre Livre, 28/9/1871) os/as filhos/as também seriam separados/as da mãe. A mãe continuaria tendo sua vida vinculada ao necropoder. Seu/sua filho/a passaria, “legalmente” (as aspas são para produzir um ruído entre a promessa – o legal – e a vida real), a compor a população brasileira, inserindo-se nos marcos da cidadania, âmbito da biopolítica. O corpo da mulher escravizada transforma-se, nesse contexto, em síntese exemplar do que nomeio de necrobiopoder. A promoção continuada da morte para populações (necro), por um lado, e de políticas voltadas para o cuidado e a reprodução da vida (bio), por outro, está na “al

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