Não fazer nada – com Adorno?

Não fazer nada – com Adorno?
Capa da edição brasileira de 'Minima moralia', de Adorno (Reprodução)
  A certa altura de Minima moralia, Adorno trata de discernir o sentido e o valor da locução “não fazer nada”. Quem já leu o aforismo n. 100 desse livro estará lembrado de que o autor alemão recorre a expressões em língua francesa, por duas vezes: a primeira, remetendo ao título de um livro de Maupassant, Sur l’eau, corresponde igualmente ao nome escolhido para o aforismo em questão; a segunda, emergindo nos momentos finais do texto, compõe uma figura expressiva para o não idêntico – rien faire comme une bête. Algo bem diverso de um luxo à maneira de Voltaire e suas luzes, esses recursos ao idioma estrangeiro compõem uma paisagem afeita a deslocamentos e descentramentos, quase um noturno, algo mais próximo dos andamentos de um sonho acordado, ao modo de Rousseau. E por falar em não fazer nada, tampouco será o caso de imaginar Adorno persistindo no lugar-comum do totalitarismo, aquele que, segundo Marcuse, nunca para de fazer, por toda parte, questão de repetir e de propagar “não há alternativa”. “Não fazer nada como um animal” – traçar o percurso dessa Ideia significa, sem dúvida, enxergá-la como incongruente com os roteiros oficiais do princípio de realidade, não temer a ruptura que nela se acha implicada, atrever-se a não alimentar esperanças por nada daquilo que, justamente, ela se recusa a prometer. Antes então de tomá-la como insolência involuntária de um ocioso notável, antes de prejulgá-la como resignação de um crítico sob o jugo crescente do autoritarismo, nela talvez valeria a pena supor uma vir

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