Ferenczi: diferença e multiplicidade
Cross-dressers em Budapeste no início do século 20 (Foto: Reprodução)
Os feminismos, os movimentos queer e os estudos de gênero têm interpelado com insistência a psicanálise. Defendem a ideia de que a sexualidade é múltipla e não pode se restringir a apenas duas possibilidades – masculina e feminina – com traços previamente definidos. Questionam a proposta de fazer da diferença sexual a matriz de qualquer diferença possível, todas elas articuladas em torno do falo.
Acontece que a diferença sexual não é uma evidência, e sim uma maneira, entre outras possíveis, de interpretar aquilo que percebemos no mundo. Quando o dividimos em dois, há sempre um lado que funciona como referência, eixo do universal e do neutro, sendo o outro definido a partir dele. No campo tradicional da psicanálise, esse parâmetro é o falo. O feminino é então pensado como caso particular, continente negro, não todo, posição a menos (no caso da inveja do pênis) ou a mais (no caso do gozo da mulher); de qualquer modo, a referência ao falo permanece. Toda divisão de mundo em duas partes elege cidadãos de segunda classe – mesmo que sejam enaltecidos e bajulados.
Que a sexualidade seja um dispositivo histórico de poder, como tem sido denunciado desde Michel Foucault, e especialmente pelas teorias queer, é algo que não pode mais ser desconsiderado pela psicanálise. Como disse recentemente o filósofo Paul Preciado, os analistas estão diante de uma escolha histórica sem precedentes: ou continuam a trabalhar com a velha epistemologia da diferença sexual e legitimam o regime patriarco-colonial que a sustenta, ou se abrem a um
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