O reino da doença
Edição do mêsPaula Fábrio, autora de Casa de família (Júlia Mataruna)
Logo na abertura de A doença como metáfora, Susan Sontag defende que “todos nascemos com dupla cidadania, uma do reino da sanidade e outra do reino da doença”. A sentença nos alerta sobre a impossibilidade de câmbio entre os dois mundos. Quem está são vai para um lado; quem está doente, para outro. Isso se confirma para quem lê Casa de família, romance de Paula Fábrio, publicado em 2024 pela Companhia das Letras. A doença como condição, tema da obra, se desdobra na enfermidade como metáfora, transformando a mãe, antes produtiva e motor da casa, em um peso, um símbolo do mal que se aprofunda com a progressão de sua dependência. A enfermidade leva ao empobrecimento e serve de justificativa para a decadência dos familiares que a cercam. “Então veio Toninho e bateu na cabeça dela como punição. Cada vez que ele passava dos limites, aquilo funcionava como um alerta para nós, da raiva que temos dos doentes. Da subsequente vergonha do que somos.”
A doença não se restringe à decrepitude em que se encontram a protagonista em 2019 e sua mãe nas décadas de 1980 e 1990. Ela se apresenta como vários nódulos: na compulsão de uma das empregadas domésticas, na falta de caráter do irmão e no modo como a protagonista se refere à dissidência de sexualidade do ex-noivo. “Não tenho nenhum amigo gay. Como todo mundo na rua Sertões e na minha família, considero isso uma doença, um desequilíbrio, algo surreal”, dispara a narradora, que, o tempo todo, joga com a pressuposição de que seu pensamento é corroborado e, portanto, pass
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