Entre a norma e a realidade

Entre a norma e a realidade

Celso Lafer, professor de Filosofia do Direito na Faculdade de Direito da USP, ex-ministro das Relações Exteriores e membro da Academia Brasileira de Letras, recebeu a revista CULT em seu escritório paulistano

 

 CULT – Como se aborda inicialmente a Filosofia do Direito?
Celso Lafer –
Para começar essa reflexão sobre Filosofia do Direito devemos recorrer à noção de paradigma concebido como abordagem-padrão, um estilo de pensamento representativo de um corpo de conhecimento básico, com um conjunto de hipóteses específicas. Cabe lembrar que há situações em que ocorre um deslocamento de paradigmas que traz uma mudança de perspectiva. Por que eu digo isso? Digo isso porque havia um paradigma daquilo que hoje nós chamamos de a Filosofia do Direito. Que paradigma era esse? Era o paradigma do Direito Natural. Aristóteles estabelece uma dicotomia entre a lei particular, que cada povo dá a si mesmo, e uma lei geral, que é conforme a natureza. O exemplo literário clássico é a Antígona de Sófocles. Porque há um conflito entre Antígona e Creonte, um conflito em que a lei comum (a lei natural) se coloca num plano acima da lei particular (a lei da cidade). Esse paradigma levou a uma dicotomia: de um lado você tem o Direito Natural, do outro você tem o Direito Positivo. E nesse paradigma existe uma certa crença que atribui ao Direito Natural certas características: a idéia da imutabilidade, a idéia da universalidade, a idéia de que nós temos acesso a essa noção de imutabilidade e universalidade, ou pela razão, ou pela intuição, ou pela revelação.

CULT – Isso se confunde com a idéia de justiça.
C.L. –
Exatamente. A idéia ou o papel dessa dicotomia é de realçar que a função do Direito é qualificar as condutas em boas ou más. Justas ou injustas. A idéia da prevalência do Direito Natural significa sempre um esforço de procurar apurar o conteúdo de justiça inerente a todos nós e presente na norma. Esse paradigma foi se desenvolvendo durante séculos, tem várias características e chegou a nós com a fundação dos cursos jurídicos. Em 1827, quando os cursos jurídicos foram fundados no Brasil, havia um estatuto do Visconde de Cachoeira; uma das coisas que ele dizia e que vale a pena mencionar, porque mostra a importância do paradigma, é a seguinte: que, no primeiro ano do curso, deveria haver uma cadeira de Direito Natural. A sua justificação era que o Direito Natural, ou da razão, é a fonte de todo o Direito, e na razão apurada e preparada por boa e luminosa lógica se vão achar os princípios gerais e universais para regular todos os direitos, deveres e convenções. Seria um curso de introdução imbuído do paradigma do Direito Natural. O primeiro professor de Direito Natural e Direito das Gentes ou Direito Internacional Público em São Paulo foi o professor Avelar Brotero. Existe uma ressonância curiosa com a minha própria formação, a de associar o Direito Natural e o Direito Internacional. Essa é uma tradição que tem o seu papel. Grócio foi o primeiro grande jusnaturalista moderno e o primeiro grande internacionalista. De Grócio a Kelsen, o autor da teoria pura do Direito, verifica-se uma relação entre a Filosofia do Direito e o Direito Internacional. O que se explica, porque a relação entre as normas e a realidade no campo do Direito Internacional é sempre problemática e requer um parar para pensar o que é o Direito e o seu papel. A dicotomia Direito Natural e Direito Positivo, com preeminência dada ao Direito Natural, perdurou por séculos, mas houve, por assim dizer, no mundo moderno, no correr do tempo, uma erosão do paradigma do Direito Natural.

CULT – Quais foram, então, os resultados dessa erosão?
C.L. –
Essa erosão veio pela secularização, pela diminuição do papel de Deus, pela idéia de sistematização e organização e pela idéia da positivação, ou seja, pela transformação dos valores em Direito Positivo que também trouxe a percepção da instrumentalização do jurídico. Uma das dimensões da erosão de paradigma é o desenvolvimento da legislação em detrimento do costume e a idéia, por exemplo, de que o Código de Napoleão – o Código Civil francês – representa, por suas qualidades, uma expressão plena do potencial do Direito. Daí a valorização do Direito Positivo e subseqüentemente a procura da “cientificidade” do Direito, isto é, a idéia de que o Direito incorpora os valores da ciência nas normas jurídicas numa concepção unitária e não dicotômica do Direito. No Brasil, Tobias Barreto é, por exemplo, um pensador que procurou no Direito a sua dimensão científica, inspirado pelo evolucionismo, no contexto do “bando de idéias novas” da Escola do Recife.

 CULT – O que vai dar no positivismo…
C.L. –
O que vai dar no positivismo. Clóvis Bevilacqua é um herdeiro de Tobias Barreto e agregou à mentalidade da Escola do Recife, no Código Civil de 1916, a precisão dogmática que vem de Jhering. O nosso Código Civil de 1916 se deve ao Clóvis. Ele é o acadêmico fundador da minha cadeira na Academia Brasileira de Letras; é uma grande figura que evoquei no meu discurso de posse.
Mas, retomando o fio da meada do deslocamento do paradigma: há uma mudança no entendimento da função do Direito. O Direito passa a ser percebido como um instrumento de gestão da sociedade. Daí a associação entre Direito e poder que está na raiz do positivismo jurídico. A sua expressão clássica é Hobbes. É o poder que unifica o significado múltiplo da palavra e diz o que é justo e o que não é justo. Hobbes entende que a anarquia do “Estado de Natureza” representa também a anarquia dos significados das palavras e que cabe ao poder unificar o significado da palavra para que haja ordem. No século 19, a clareza inicial do paradigma da Filosofia do Direito vem de Hegel. Hegel, ao escrever os fundamentos da Filosofia do Direito, aponta a erosão do tema do Direito Natural. Sinaliza a mudança do paradigma.
O paradigma da Filosofia do Direito como área do conhecimento, que eu procuro estudar, tem vários campos. Quais são esses campos? O primeiro campo é o campo metodológico. Neste há uma relação do Direito com outras disciplinas. Há sempre a preocupação de ter, em matéria de metodologia, o up to date. O que na época de Tobias era o evolucionismo, hoje, na discussão da metodologia, está na análise da linguagem. Um dos meus colegas da Faculdade, Tércio Sampaio Ferraz Jr., tem desenvolvido isso com muita originalidade. Você tem uma análise sintática do Direito, que é a da coerência das normas no ordenamento; você tem uma análise semântica do Direito, que é a discussão da mudança e você tem uma análise pragmática do Direito ligada à persuasão na busca de caminhos e soluções no Direito em operação.

 CULT – Tudo passa por aí, não é?
C.L. –
Sim. Observo a relação com a retórica, pois o advogado argumenta para convencer o juiz. O juiz motiva a sua sentença para convencer as partes e o auditório jurídico dos operadores do Direito. Há sempre essa idéia de fundamentar e persuadir que é uma faceta da racionalidade concreta do Direito. Outro campo está voltado para examinar o Direito a partir de um ângulo interno do próprio Direito. Esta é a chave de acesso ao positivismo jurídico, voltado para as normas inseridas num ordenamento. O positivismo jurídico responde a uma necessidade prática. Como o Direito está em permanente mudança, não dá para defini-lo pelo conteúdo, pois o seu conteúdo é mutável. É preciso defini-lo pela forma, para diferenciar o Direito do não-Direito. Isso se faz pelo conceito de validade. É direito válido o criado de acordo com os procedimentos previstos no ordenamento para se criar o Direito. Kelsen e um pós-kelseniano inglês, muito interessante, Hart, diferenciam dois tipos de normas: primárias e secundárias. As primárias prescrevem comportamento, as secundárias são normas sob normas, isto é, tratam da criação de normas e de sua aplicação. São estas últimas que determinam a validade.

 CULT – Como se dá a relação entre norma e realidade??
C.L. –
A sua pergunta esclarece o porquê de outros campos da Filosofia do Direito. Há os que procuraram, com razão, lidar com um sério problema que é o hiato entre norma e realidade, ou seja, o que afasta o ordenamento da realidade. E aí temos duas dimensões importantes da Filosofia do Direito a partir da incorporação do ângulo externo ao estritamente jurídico. Por exemplo, os fatos sociais. Em que medida o Direito tem ou não um impacto na realidade social e como é que o Direito se ajusta, apropriadamente, à realidade social? No caso do Brasil, por exemplo, nos anos de 1930, a criação do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho foi uma tentativa de aproximar o Direito da realidade social por meio de um Direito menos formal que levasse explicitamente em conta, nas suas aplicações, as realidades sociais. Outra dimensão, muito importante do ângulo externo, diz respeito aos valores que são importantes a começar pelo valor justiça. No contexto dos valores, Norberto Bobbio lembra que a noção de justiça é uma noção problemática. Existem vários critérios de Justo. Daí o problema da relação entre a justiça da norma e a legitimidade do poder que coloca esta norma positiva. É isso que explica a aproximação entre a Filosofia do Direito e a Filosofia Política, uma aproximação com a qual me identifico na linha de Bobbio, da mesma maneira como a relação do Direito Internacional com a Filosofia do Direito se coloca, naturalmente, na minha trajetória. Falo da relação entre Direito e poder e da interação entre a legitimidade do poder e a justiça da norma. O professor Miguel Reale tinha, desde o início de suas formulações, uma preocupação grande em postular uma visão integrada da experiência política e da experiência jurídica. Qual era a idéia-chave dele? No seu tridimensionalismo o Direito é fruto de uma interação dinâmica entre os fatos sociais, os valores e as normas. A norma é sempre o equilíbrio provisório, mais ou menos duradouro, entre fatos e valores positivados pela interferência decisória do poder. Por isso acho que a reflexão do professor Reale é uma reflexão tão rica e tão válida para os dias de hoje, pois integra, numa dialética de mútua implicação e polaridade, todos os campos da Filosofia do Direito. Dito isso, para avançar um pouco na nossa reflexão, há uma distinção que Kant faz e que acho muito rica. É a distinção entre pensar e conhecer, daí a idéia de uma dicotomia, uma dicotomia entre pensar e conhecer, que não é uma dicotomia excludente mas complementar.

CULT – O que implica na importância da experiência jurídica…
C.L. –
Com efeito, conhecer está muito ligado, no campo jurídico, ao conhecimento do Direito Positivo. Já, pensar é pensar os problemas do Direito Positivo e para os quais o Direito Positivo não oferece, enquanto tal, uma solução. É por isso que diz Bobbio, que é um pensador que me marcou muito, que quem pára para pensar os problemas do Direito Positivo são os juristas com interesses filosóficos. São eles que lidam com os problemas concretos. Daí a idéia que o professor Reale explora também, a de que a Filosofia do Direito é basicamente um esforço de pensar o Direito com base na experiência jurídica. Se nós olharmos os grandes nomes: Savigny, Geny, Santi-Romano, Jhering, Kelsen, Reale, Bobbio, Hart, são todos eles pensadores que foram além do Direito Positivo, mas que tiveram como ponto de partida a experiência jurídica.

CULT – Seria algo que viria posteriormente?
C.L. –
Sim, com o resultado do esforço de pensar os problemas. É o caso que mencionei a você da dificuldade de definir o Direito pelo conteúdo. A definição do que é Direito é fundamental para diferenciar aquilo que é direito daquilo que não é direito. Se não consigo definir por conteúdo, acabo definindo pela forma, pela validade, que é o que explica a experiência do desenvolvimento do positivismo jurídico. A palavra experiência é uma palavra que vem do latim experire, ensaiar, testar, pôr à prova. E é algo que diz respeito a quem conhece ou se propõe a conhecer e o objeto com o qual quem conhece, se confronta. O tema da experiência jurídica é muito rico para entender o que é o paradigma, hoje, da reflexão sobre o Direito.

 CULT – E há controvérsias?
C.L. –
Há muita controvérsia, há muitas escolas… Há uma crise no positivismo jurídico. Esta crise do positivismo jurídico significa uma nova presença dos valores, ou melhor, do reconhecimento da importância dos valores e do seu papel na vida do Direito. E como é que nós podemos detectar isso? Uma Constituição como a nossa, que é de 1988, tem muitos princípios. Os juristas fazem grandes distinções entre princípios e regras. Princípios são mais gerais, regras são mais específicas. A interpretação e a aplicação de regras são mais fáceis que a interpretação de princípios. Os problemas são distintos. Uma Constituição como a nossa tem vários princípios. Em tese, eles não são abstratamente contraditórios. Mas, quando confrontados com o caso concreto, o intérprete tem de lidar com a hipótese dos princípios poderem gerar antinomias.

 CULT – Como se resolvem esses conflitos?
C.L. –
O Supremo – o STF – desenvolveu, e outros tribunais como o constitucional alemão e o italiano, o método da ponderação dos princípios que corresponde ao balancing do Direito norte-americano. Ponderam-se a adequação, a necessidade, a proporcionalidade para esclarecer, num caso concreto, a prevalência de um princípio em relação a outros que têm a mesma hierarquia constitucional. A hermenêutica dos princípios está muito ligada aos valores, pois os princípios são a positivação explícita de valores. No meu artigo sobre Bobbio e o Holocausto que a CULT publicou, discuti o anti-semitismo e a prática do racismo, mencionando o caso Ellwanger que o Supremo decidiu em 2003. Ali havia dois temas: o primeiro é o que é raça; o segundo é se havia ou não conflito entre a penalização do racismo e a liberdade de opinião. No caso do racismo, o que se alegava é que os judeus não são uma raça, logo, o crime cometido por Ellwanger não era de racismo. Com isso se estava procurando obter a prescrição do crime, pois a prática do racismo é constitucionalmente um crime imprescritível e a discriminação atentatória aos direitos não o é. A Constituição fala do crime da prática do racismo; para quem vem do Direito Internacional, a noção de prática é importante. É a prática do Estado, o comportamento dos Estados. Então, a idéia que eu procurei desenvolver era a idéia de que você não qualifica o tema do crime de racismo a partir da noção de raça, porque não existe raça. Há apenas uma raça, a raça humana.

 CULT – Mas a raça existe na cabeça dos racistas.
C.L. –
Exatamente. É isto que leva ao comportamento, a prática. A qualificação do crime pela noção de raça torna o crime um crime impossível pela inexistência científica de raça. A prática do racismo, no entanto, existe, e tem a sua origem na cabeça dos racistas. A qualificação pela prática tipifica a intenção de discriminar negativamente, diferenciando raças superiores das inferiores. No caso, tratava-se da publicação permanente e sistemática de obras anti-semitas, inclusive a negação do Holocausto com o intuito de hostilizar os judeus. Neste contexto colocou-se o princípio da liberdade de opinião. Existem limites para a liberdade de opinião? Aí o argumento que o Supremo acolheu foi o de que o princípio da dignidade da pessoa humana está acima da liberdade ilimitada de opinião, na forma dos escritos de ódio, do hate speech. Não é, friso, censura prévia, é a pessoa se responsabilizando por aquilo que faz, como ocorre na calúnia, na injúria e na difamação. O Supremo, neste caso, fez a ponderação dos princípios e tratou do tema dos valores e da sua hierarquia. O tema dos valores também está presente, por exemplo, na discussão da obrigatoriedade do diploma para jornalista e a liberdade de opinião e expressão. Se a auto-organização e suas exigências para o exercício profissional, como é o caso dos médicos e dos advogados, se aplicam no capítulo do jornalismo. A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em parecer consultivo, disse que é claro que há liberdade de associação, mas que esta não é a mesma coisa que a auto-organização da profissão, como existe no caso dos médicos e dos advogados. Por isso prevalece a liberdade de opinião sem restrições em matéria de formação profissional. Esse é um caso que está em discussão no judiciário brasileiro. O Código Civil atual, que deve muito ao professor Reale (assim como o Código do Clóvis exprimia a visão do Clóvis), também reflete a preocupação do professor Reale com a presença dos valores na vida do Direito. É por isso que você tem certas cláusulas gerais, como a boa fé, a função social da propriedade que explicitamente inserem, na aplicação do Direito, o tema do valor. Tais assuntos aparecem também como parte de uma preocupação com os fatos sociais. Há uma corrente, a dos critical legal studies, que afirma uma preocupação com a noção de justiça freqüentemente comprometida pelo Direito Positivo. Daí a idéia do “direito alternativo”, vale dizer, cabe ao juiz fazer, ele mesmo, uma interpretação do justo, independentemente do Direito Positivo. Essa é uma corrente que tem algum papel no Brasil. Outra corrente de corte ideológico oposto, desenvolvida nos Estados Unidos, é a da “Law and Economics”, que defende uma interpretação econômica do Direito. O juiz deve ter, também, presente na decisão, uma avaliação das conseqüências econômicas da sua decisão, ou seja, a decisão deve atender ao bem-estar geral da sociedade em termos de eficiência na alocação de recursos quando, por exemplo, são examinados processos que tratam da relação entre o Estado e os particulares. Seria o caso das inúmeras ações sobre os planos econômicos e em matéria de previdência social. Menciono a você um outro dado que eu acho muito importante e que também explica a erosão do paradigma do Direito. O paradigma do Direito Natural tinha a sustentá-lo a idéia de que a natureza era imutável e tinha, assim, uma força normativa que oferecia um padrão para a conduta humana em mutação permanente. Não é mais assim porque hoje em dia a natureza não é um “dado”, é um “construído” sujeito à manipulação humana.

CULT – A noção do Direito Natural, como acontece na Inglaterra com a common law, está na base disso?
C.L. –
Está e não está. A diferença da common law é que a common law é indutiva. Você tem casos; a partir dos casos, você tem os precedentes e depois o problema que se coloca para o juiz é como enquadrar o caso concreto num precedente.

CULT – Mas as coisas são vistas meio que exteriormente à regra, não é?
C.L. –
Você tem precedentes e depois, por analogia, você ajusta o caso ao precedente. A nossa tradição românica, dos códigos, é dedutiva. Você tem uma regra e ajusta o caso concreto à regra geral. É o que os juristas chamam de subsunção: enquadrar o caso na regra geral. Agora, isso também é complicado porque, além das regras específicas, existem os princípios gerais que desafiam a subsunção, como já comentamos. Também no caso dos precedentes existem desafios hermenêuticos.
Com efeito, o problema de toda a analogia é saber em que medida existe a semelhança e se a semelhança é relevante ou não. Bobbio dá um exemplo muito ilustrativo, bom para a sala de aula. Ele diz: “olha, eu tenho um carro vermelho e o meu vizinho tem um carro vermelho. O carro vermelho do meu vizinho sobe a ladeira sem nenhuma dificuldade, já o meu carro sobe com muita dificuldade”. O erro da analogia seria achar que um carro vermelho é semelhante a outro carro vermelho. O motor de um carro e o motor do outro são os critérios apropriados para a aproximação. A aparência não resolve. Por isso, no trato dos precedentes, quando você decide por analogia, existem desafios de interpretação. Na prática do Direito anglo-americano há sempre um esforço muito grande de verificar, com separações ou diferenciações, se existe ou não existe a analogia como semelhança relevante.

 CULT – Com a evolução tecnológica e comportamental, o que mudou?
C.L. –
Na época em que fui estudante, investigação de paternidade era feita com as limitações do conhecimento da época. Você excluía a paternidade, mas não a confirmava. Hoje, com o DNA, você confirma. Então, o brocardo jurídico tradicional de que a mãe é sempre certa e o pai incerto deixou de ser uma máxima de sabedoria. A engenharia genética, a pesquisa em matéria de células-tronco, o que ocorre no campo ambiental com o aquecimento global mostram que os fatos da natureza não são fatos imutáveis, são fatos em permanente mudança e transformação. Daí a importância crescente da bioética e a relevância do Direito do Meio Ambiente voltado para preservar a sustentabilidade da natureza. Os comportamentos também mudaram impactando o Direito. Uma das grandes revoluções do século 20 é a revolução feminina. A alteração significativa do papel das mulheres transformou os padrões e os costumes. Trouxe alterações no campo jurídico, por exemplo, no exercício do pátrio poder em relação aos filhos, na fixação do domicílio conjugal, no regime de bens no casamento, no exercício de atividades profissionais etc. Alguns estudiosos do papel do feminismo falam da inovação representada pela moralidade do cuidado no trato das pessoas. E há também todo o tema do multiculturalismo, com as teses das políticas de reconhecimento da diferença que lidam com o alargamento do princípio da tolerância que, por sua vez, renova a discussão do princípio da igualdade e da não-discriminação.

 CULT – A revista publicou uma entrevista com Edgar Morin (CULT 111) e ele se referiu muito à multiculturalidade, à questão de como o judeu foi perseguido e massacrado, durante séculos e séculos, e exatamente é o povo que está perseguindo e massacrando os palestinos. O que o senhor poderia comentar a respeito disso?
C.L. –
Recorro preliminarmente a uma reflexão de Vidal-Nacquet sobre judaísmo e memória. A memória impacta emotivamente. A memória histórica do judaísmo é a memória da perseguição. O predomínio da memória não leva a perceber a história, ou seja, aquilo que é novo, que é diferente nas conjunturas. Hannah Arendt mostra, por exemplo, como a memória da perseguição é uma dificuldade para a percepção da diferença entre o anti-semitismo tradicional, que era religioso, e o anti-semitismo moderno como instrumento de poder na dinâmica dos regimes totalitários, como foi o nazismo. No caso do conflito entre Israel e os palestinos há, de parte a parte, a memória da perseguição que dificulta a mútua aceitação e o reconhecimento da contraposição de legitimidades. Daí um dos componentes da violência e do arbítrio.

 CULT – E a não-aceitação das semelhanças.
C.L. –
Sim. Hannah Arendt, com a qual eu concordo, diz que a violência destrói o poder, ela não cria o poder que sempre resulta do agir conjunto. A violência surge quando o poder da ação conjunta se enfraquece.

CULT – Essa é uma tese dos historiadores atuais, que estão bem nesse caminho.
C.L. –
Sim. Daí a pergunta: por que esse problema do Oriente Médio é tão complicado? Olhando o problema numa perspectiva a distância, vê-se que existe um caminho e possibilidades de uma solução, a saber: o reconhecimento dos dois Estados, um Estado palestino com viabilidade econômica e de segurança, lado a lado com o Estado de Israel, reconhecido e legitimado, vivendo com fronteiras seguras; uma partilha sábia de Jerusalém, com lastro na demografia, entre os dois Estados e um acerto quanto ao tema dos refugiados a ser equacionado por um contencioso de reparação. Era basicamente o previsto nos acordos de Oslo da década de 1990. No entanto, não é isso que está acontecendo. Por que não? São muitas as dificuldades, mas algo pode ser percebido pela distinção entre uma controvérsia e uma tensão. A controvérsia é específica e comporta, por isso mesmo, com mais facilidade, um encaminhamento jurídico-diplomático. A tensão é difusa, ela é a expressão nítida da política do poder. No centro do sistema internacional prevalece uma tensão de hegemonia, desencadeada pelo unilateralismo da ação norte-americana no Iraque. Nas diversas áreas geográficas do mundo existem tensões de equilíbrio do jogo do poder. No Oriente Médio, dada a situação no Iraque, os fundamentalismos religiosos, a situação do Líbano, as iniciativas de nuclearização do Irã etc., as tensões de equilíbrio e suas dificuldades ajudam a explicar os desastres crescentes que presenciamos.
Em síntese, para concluir esta parte da entrevista, retornando à Filosofia do Direito, diria que ela se confronta hoje com velhos problemas, como o da paz, e novos problemas. Entre outros, a crise do positivismo; os valores; as dificuldades de interpretação dos princípios; o problema do multiculturalismo e o escopo da tolerância, o fato de que as alterações do ­conhecimento científico e tecnológico transpuseram barreiras antes tidas como naturais, colocando novos problemas e ensejando a bioética e as dificuldades para a preservação da dignidade humana na tutela dos direitos – do direito à intimidade até aos referentes à conservação do patrimônio genético do ser humano.

 CULT – O que nos leva à questão da Amazônia, vista sob o plano do Direito Internacional de um lado, e o plano da soberania nacional de outro. Acha que vai haver algum acordo, algum acerto em nome da sobrevivência da humanidade?
C.L. –
Esse é um tema muito importante. Um tema que, naturalmente, preocupa a todos. O aquecimento global é um tema global. Não adianta tomar uma medida específica se o alcance é geral. Se houver o degelo da calota polar da Antártica, isso afeta a humanidade como um todo. A idéia que se consagrou na Conferência do Rio, em 92, foi o conceito do desenvolvimento sustentável. A sustentabilidade do desenvolvimento envolve o tema ambiental em seus diversos desdobramentos. Um deles é o aquecimento global e a mudança climática. Uma parte importante disso está ligada aos padrões de produção de consumo e à utilização de energia fóssil: petróleo, carvão etc. Mas esse não é o único elemento. Um dos elementos que geram CO2 são também as queimadas. E no capítulo das queimadas e do desmatamento é que surge a preocupação com a Amazônia.

 CULT – Como proceder, no caso?
C.L. –
Quando deixei o Ministério, em 2002, uma das coisas que procurei fazer foi institucionalizar a Secretaria do Tratado da Cooperação Amazônica, que é um tratado dos anos 1970, mas que tem já uma preocupação ambiental. Por que fiz isso? Porque claramente me dei conta de que a região amazônica é um todo, ela é nossa, mas é também dos vizinhos que são nossos parceiros amazônicos. Meu objetivo era ver em que medida o tratado da cooperação amazônica poderia gerar projetos e oportunidades de financiamento e de atividades que permitissem um aproveitamento sustentável da região amazônica, que fosse saudável do ponto de vista do meio ambiente, mas que não fosse apenas uma espécie de conservacionismo porque temos pessoas morando ali e que precisam ser atendidas. Não cabe uma Amazônia sujeita a um controle internacional, mas acho que é nossa obrigação cuidar desse tema em conjunto com nossos vizinhos. É por isso que, ao institucionalizar essa secretaria para tratar da cooperação amazônica, a minha idéia, que não foi levada adiante nesse período todo, era a de agir conjuntamente com nossos vizinhos que têm tanto interesse quanto nós na região e que são parceiros legítimos nesse processo, para encontrar caminhos de sustentabilidade ambiental. Há várias maneiras de lidar com isso. Assisti ontem ao filme-documentário de Al Gore. É um filme extremamente interessante, muito bem feito e trabalhado. O governador Serra fez ontem, após a exposição do filme no Palácio dos Bandeirantes, uma intervenção. Tomou a iniciativa de dizer que o Estado de São Paulo pretende tomar certas medidas na área ambiental. Elas são limitadas, mas relevantes. Uma das medidas é a etiquetagem de madeira. O objetivo é só poder usar economicamente madeira que é fruto de reflorestamento e de processos renováveis de manejo, para acabar com a história do desmatamento predatório. A etiquetagem é importante; é uma maneira de se reduzir os riscos predatórios porque aí existe a possibilidade da mobilização do consumidor.
Resumindo, para dar uma resposta mais precisa, acho que o tema amazônico é um tema importante, um tema essencialmente da nossa responsabilidade e da responsabilidade dos nossos vizinhos, mas é um tema em relação ao qual nós não podemos bancar o avestruz e enterrar a cabeça. É um tema nosso, mas de alcance internacional. Portanto, nos cabe lidar com ele de frente. Acho que o Brasil teve, na década de 1990, na Conferência do Rio e depois durante o governo do presidente FHC, uma sensibilidade importante em relação ao meio ambiente. Sensibilidade essa que anda atenuada e que cabe colocar e acho que cabe colocar até no sentido de que, por exemplo, o embaixador Rubens Ricúpero observou, apontando que o tema ecológico, o tema do meio ambiente, é um grande tema da agenda internacional no âmbito do qual o Brasil tem capacidade de protagonismo.

 CULT – O Brasil tem um papel importante a desempenhar?
C. L. –
Sim. Neste tema, nós somos uma grande potência, não só pela floresta amazônica, mas também pelo capítulo da megadiversidade, do etanol etc. Então, temos um papel a desempenhar, e este papel passa não apenas por uma ação defensiva, mas por uma ação proativa. Com enlace entre a conduta interna e o desempenho externo. Exemplifico com uma analogia: quando na Conferência de Doha, da OMC, em 2001, se colocou o tema do Acordo de TRIPs e saúde pública, vale dizer, a possibilidade de romper patentes em temas fundamentais de saúde pública, sustentamos esta tese e fomos bem-sucedidos. Fomos bem-sucedidos porque o programa brasileiro contra a Aids era um programa muito bem desenvolvido. Tínhamos o lastro do desempenho interno, que deu um reforço ao nosso pleito internacional e legitimidade à nossa ação diplomática. Nesta área de meio ambiente, para termos este papel construtivo que tivemos em Doha e desempenharmos nosso papel no mundo, precisamos ter o respaldo da ação interna a fim de ter um papel externo compatível e uma ação diplomática legitimada pela conduta.

 CULT – Abordando os males brasileiros, gostaria de passar para a área de violência. Como o senhor vê a questão da impunidade, da justiça que não funciona?
C.L. –
Vejo isso com uma enorme preocupação e acho que é um dos grandes problemas da sociedade brasileira. Não tenho para isso nenhuma fórmula ­mágica. Sem dúvida, o capítulo da justiça é muito importante, e aí há uma formulação clássica que remonta a Beccaria; mais que o tamanho da pena, o grande problema é a impunidade, é a prevalência da sensação de que o crime não será punido.

 CULT – E quanto à discussão sobre a maioridade penal?
C.L. –
Esse é um tema que comporta discussão. O próprio governador Serra escreveu um artigo interessante, dizendo que era possível mudar o Estatuto da Criança e do Adolescente para estender o período de retenção do infrator, tornando-o maior do que o que existe hoje, sem ter que lidar com a maioridade penal.
Há todo esse argumento de que uma pessoa com 18 anos no passado e uma pessoa com 16 anos hoje são coisas distintas, pela informação, pela cultura, pelo acesso ao mundo da informação e da violência. Claro que há todo esse problema do processo da educação, da escola. Acho que este é um dado importante e que há um descompasso enorme entre as normas e a realidade. Acho que é um dos grandes temas da Filosofia do Direito. E é um dos grandes temas de política do Direito e um dos grandes problemas do país.

 CULT – Os códigos, tanto penal, como processual, são antigos. Certamente volta mais uma vez a questão da realidade. A realidade mudou e os códigos continuam. E a Justiça vai se adequando, do jeito que dá, aos trancos e barrancos….
C.L. –
Uma das discussões em matéria de processo é a quantidade de recursos, arrastando os processos no tempo, levando a uma observação válida: a justiça que tarda é uma justiça que não se faz. Há advogados que colocam dificuldades em relação a esse tema por razões de mercado e muitos juízes também. O juiz de primeira instância resiste à súmula vinculante e mesmo um juiz de tribunal superior de segunda instância nela sente uma limitação à sua atividade. Pessoalmente entendo que o congestionamento do Supremo, hoje prevalecente, é impeditivo de uma boa justiça. É preciso ter uma primeira instância, a possibilidade da revisão de uma decisão de primeira instância através de uma apelação para uma segunda instância. Outros recursos e uma terceira instância caberiam apenas naqueles casos sérios de alcance constitucional, nos quais a matéria tenha uma relevância geral. Senão a justiça tarda e a controvérsia não se resolve, que é a finalidade para a qual existe a função jurisdicional.

 CULT – Mas então o senhor acha que uma reforma tanto desses códigos quanto uma reforma judiciária são imperiosas?
C.L. –
São temas da maior atualidade, estão na ordem do dia. Eu acho que se avançou um pouco nisso.

CULT – O que o senhor, digamos em termos gerais, recomendaria para melhorar essa situação?
C.L. –
A Constituição de 1988 abriu muito o campo da justicialização das controvérsias: direitos difusos, direitos do consumidor, papel ampliado do Ministério Público, toda a parte ambiental. Então você tem um mundo jurídico confrontado com novos problemas e para os quais nem sempre as pessoas já estão equipadas para lidar com eles. Vamos dar um exemplo: análise de impacto ambiental, que é uma coisa que hoje se exige e que é razoável que se exija, em função do que conversamos. Há, no entanto, com freqüência, burocratização e, por vezes, deficiências por falta de conhecimento apropriado.

 CULT – Um exemplo que é flagrante também, numa escala nacional, é ter muita percepção de que a Justiça é impotente em relação a questões como a do MST. O MST faz o que bem entende e a Justiça apenas observa. Ela toma decisões pontuais, aqui e ali, prende o José Rainha por três dias e fica nisso.
C.L. –
Os movimentos sociais fazem das ocupações uma forma de inserir o tema na agenda nacional. O Brasil hoje é um país urbano e não um país agrário como era quando o tema da reforma agrária surgiu nos anos 1940, 1950. Há um tema que move muito o MST que é a idéia da agricultura familiar como contraponto ao processo de globalização. Há espaço para a agricultura familiar, mas se não houvesse o agronegócio, no seu sentido amplo, com a sua eficiência, estaríamos todos morrendo de fome. Só a agricultura familiar não iria nos alimentar, nem permitir as exportações brasileiras, nem seria capaz de gerar por exemplo, alternativas, de energia renovável como o álcool. Em síntese, o MST é um problema de inclusão social de natureza política.

 CULT – Porque também aparece a vertente política.
C.L. –
Sem dúvida. Há uma vertente política e uma sensibilidade da tradição da Esquerda radical, que é parte do caldo de cultura anticapitalista dos movimentos sociais no Brasil. Também se deve mencionar que no interior há juízes muito jovens, que entram na carreira muito novos. Não é fácil você pedir a alguém com menos experiência de vida decisões que afetam situações, problemas que são muito complicados. Não que eu não acredite nos jovens, mas decidir é complicado, é um desafio grande.

 CULT – Agora que o senhor falou disso, a questão da formação dos advogados, da capacitação em termos de exame da Ordem, o senhor acha que isso vai melhorar?
C.L. –
Acredito que o exame da Ordem seja válido, ­acho que dá legitimidade profissional, pois entendo que tem havido muita proliferação de faculdades de Direito e o controle acadêmico é sempre mais frágil do que seria desejável. Acho que a Ordem faz um controle profissional que considero válido
e necessário.

 CULT – O senhor, como professor, tem visto uma queda na capacidade dos seus alunos ou está igual à de anos atrás?C.L. – Comecei a dar aula em 1971, na Faculdade de Direito. Tenho certa experiência. Os alunos da Faculdade do Largo São Francisco, regra geral, são alunos muito bons. Agora, há mudança, não necessariamente de qualidade, mas de perspectiva. Nos anos 1970, nos anos 1980, havia muito maior preocupação de ordem política. Hoje eu vejo uma diminuição desse tipo de preocupação; as pessoas estão mais voltadas para os seus caminhos profissionais, têm menos foco para o “espírito público”; menos interesse pela coisa pública. A faculdade é um “local da memória” do Brasil, tem uma “autoridade” que provém do seu papel importante na trajetória brasileira. Ela é uma faculdade de qualidade e, em contraste com outras faculdades, inclusive as boas, é mais abrangente. Você tem lá alunos que vão para a advocacia empresarial, para o Ministério Público, para a magistratura, que vão para a carreira política etc. Enfim, do ponto de vista de uma formação mais ampla, a faculdade, no meu entender, oferece mais do que qualquer outra que eu conheço. Acho que a faculdade começa a enfrentar também concorrência, porque a advocacia de hoje, “apesar dos pesares”, é uma profissão bem remunerada. Daí uma demanda por profissionais competentes e a resposta a isso, através de novas escolas, que procuram responder a exigências de qualidade e não apenas a demanda por diplomas. Então, o nosso desafio na faculdade é manter qualidade, não só pelas exigências da sociedade brasileira, mas também, por conta dessa saudável concorrência que atualmente começa a existir.

 CULT – O senhor tem uma atuação grande, além do Direito, e mesmo na política, na questão cultural. O senhor faz parte de vários conselhos de instituições culturais e da Academia Brasileira de Letras. Os mecanismos que estão sendo usados para patrocínio da cultura, a motivação cultural, o senhor acha que eles são suficientes ou poderiam ser aperfeiçoados?
C.L. –
Não é fácil dar uma resposta. Existem incentivos e eu acho que são importantes. Há, porém, uma associação grande entre o marketing e o incentivo que, às vezes, distorce as coisas, na forma de eventos nos quais por vezes se dissolve a dimensão do processo, inerente à criação cultural. Quando eu estava no Ministério e dava entrevistas coletivas, freqüentemente meus interlocutores jornalistas diziam: “Ministro, não explique o processo diplomático porque isso não dá lead, não dá manchete. Trate de um evento, comente o evento do dia, porque fora do evento não há pauta, não há salvação”. É compreensível esta exigência, pois o tempo da mídia (não é o caso da CULT) normalmente é o tempo on-line. É o tempo em cima do acontecimento, não é o tempo dos processos, da reflexão. O tempo da cultura, como o da diplomacia, também é um tempo mais longo, é um processo. Boa parte dos incentivos fiscais favorece o evento. Daí o risco do descompasso entre os processos e o evento. Nas instituições culturais importantes, consolidadas, com sentido de direção, pode-se ir lidando com os eventos dentro da lógica do prazo mais amplo dos processos, mas em muitos casos o evento incentivado se dilui em função do on-line do marketing e dos meios de comunicação.

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