Ecos de setembro

Ecos de setembro

O filósofo John Shook, diretor do Pragmatism Archive, da Oklahoma State University, fala na entrevista abaixo sobre o atual momento da democracia norte-americana.

Paulo Ghiraldelli Jr. 

CULT – O presidente George W. Bush parece preocupado. Há meses ele era tido como um herói, mas agora… O que você pensa sobre isso? O povo americano está entendendo o problema do Iraque ou está imaginando um novo Vietnã?
John Shook –
Muitos americanos votaram em Bush por ter ele uma forte relação no exterior. Depois de 11 de setembro, essas pessoas esperavam que Bush resolvesse o problema do terrorismo sem pedir opiniões e permissão para outros países. Quando Bush voltou do Afeganistão e do Iraque, os americanos não estavam preocupados com a falta de respeito da América pelas Nações Unidas, mas sim por ele ter seguido a preferência dos europeus. Os liberais democratas e alguns moderados, que nunca suportaram Bush, haviam se afligido por Bush estar tomando decisões rapidamente, sem a ajuda do conselho mundial. Entretanto, em 2002, pelo menos 70% do país, inclusive muitos liberais, estava contente por Bush ter eliminado Sadam. Mas agora esses liberais estão muito insatisfeitos por Bush não ter dado uma explicação razoável pelo ataque ao Iraque. Eles estão aflitos com o fato de o Iraque poder vir a se tornar rapidamente um Vietnã.

Todo o povo americano tem grande interesse e compaixão pelos problemas iraquianos. Todos nós queremos que o Iraque tenha melhor infra-estrutura, alimentação, poder, escolas etc. Se Bush pudesse mostrar aos iraquianos que o Iraque está melhorando, o terrorismo contra as tropas e a administração no Iraque diminuiria e menos soldados americanos morreriam. Sendo assim, os iraquianos ficariam felizes com a aproximação de Bush. Porém, os americanos que são contra o Bush acreditam que ele nunca será capaz de resolver os problemas iraquianos rapidamente o bastante e que o terrorismo ficará cada vez pior, prevendo que o Iraque terá um novo governo para controlar todo o país.

Penso que no próximo ano o Iraque conseguirá enxergar que o governo local do Afeganistão não controla nada, a não ser a capital. Depois disso, quem sabe? O povo iraquiano controlará seu próprio destino. Depende deles e não dos soldados americanos.

CULT – A “Lei Patriótica” (que restringe as liberdades civis no país após os ataques de 11 de setembro de 2001) é realmente uma lei? Você acredita que ela acabará? Quando?
J.S. – O patriotismo foi criado em lei quando a América estava em pânico e não tinha um pensamento claro. Na democracia, leis insensatas acontecem quando surgem emergências. As pessoas pensam em primeiro lugar na sua segurança; se elas entendem completamente ou não a ameaça, isso é outra coisa. A história americana está cheia de leis e ações governamentais que seguem essa emergência-padrão. Depois de o pânico e de a emergência diminuírem, os legisladores e juízes terão oportunidade para refletir se todas as leis são realmente necessárias. Minha previsão é a de que não serão usadas muitas partes da Lei Patriótica e algumas partes serão gradualmente eliminadas por novas leis e juízes que regram essa parte da Constituição. O sistema americano está projetado para permitir ação rápida e pensamento lento.

CULT – Você acredita no perigo do terrorismo?
J.S. –
O terrorismo é muito perigoso. Mas quanto é real esse perigo? Os liberais americanos estão preocupados porque o governo Bush quer muito segredo, e as pessoas ficam sem saber onde realmente está o perigo. Mas é claro que todo governo quer sigilo quando o assunto é a segurança. As pessoas e a imprensa têm de lutar com o próprio governo para descobrir onde realmente está o perigo do terrorismo.

CULT – O que você pensa sobre o papel do pragmatismo neste momento político nos EUA?
J.S. –
O pragmatismo é amigo da democracia, porque diz serem as pessoas capazes de decidir sobre o que deve ser feito, que elas podem descobrir o que está acontecendo no mundo. Ignorância e medo são sempre o maior problema político para a democracia (assim, a oposição é certa para a ditadura que ama a ignorância das pessoas). O pragmatismo faz oposição a qualquer um que coloque toda sua confiança nos funcionários do governo para fazerem o que é certo. Houve muito progresso na América. No começo do século 20, um presidente americano podia dizer para seu povo odiar um país inimigo, e rapidamente o país apoiaria uma guerra. Por exemplo, com ódio por todos os alemães, foi fácil produzir a Primeira Guerra. Hoje, isso é impossível – os americanos sabem que é loucura pensar que todas as pessoas de outro país são más. Bush chamou de maus somente Sadam e seus amigos – a maioria do povo iraquiano é boa e inocente.

Então, no fim do século 20 e começo do século 21, a América con-segue refletir melhor sobre a guerra, sem usar tanto ódio. Todos os países podem fazer isso também se seu povo tiver acesso livre ao rádio, à televisão e viajar para aprender sobre os povos estrangeiros. O pragmatismo ensina que medo e ódio são produtos da ignorância – quando nós podemos conversar com outras pessoas e conhecer sua cultura, nossos corações e mentes se abrem. O pragmatismo opõe-se a qualquer um que diga ser o possuidor da verdade, do conhecimento e da moral. O pragmatismo quer a América como um exemplo mundial de que a democracia pode funcionar e ter problemas também. Nós podemos ter orgulho da América, mesmo sabendo que houve coisas horríveis. Porque há uma democracia “verdadeira”, mas a América não deveria impor sua democracia a outros países. Outras nações tentarão alguma aproximação democrática. E os que admiram a América poderão experimentar por livre vontade essa democracia, até que encontrem a sua. Essa realidade já existe na Europa Oriental, na Turquia, em Taiwan, no Brasil etc. O pragmatismo encorajará entendimento e confiança entre todos os países, porque não há outro modo para que perdure a paz.                 

 Tradução de Francielle Chies

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