As retóricas da vitimização
(Foto Guinaldo Nicolaevsky/Arte Andreia Freire)
É fato que vivemos um período sem precedentes de fragmentação política no Brasil. Três dezenas de partidos políticos, por exemplo, criam a impressão não de um sistema político organizado e ideologicamente consistente, mas de um enxame de apetites e interesses em busca alucinada e incoerente de satisfação eleitoral. Por outro lado, é evidente que nem os 35 partidos que já temos seriam bastantes para representar todas as partes resultantes da fragmentação de agendas, táticas e identidades ativas na esfera pública política. Todas concorrendo a um lugar ao sol na atenção pública, todas disputando freneticamente um lugar nas filas de reivindicações e autoafirmações políticas, mesmo que isso se dê somente em ambientes políticos digitais.
Dentre as várias estratégias por meio das quais as peças do mosaico da fragmentação política se compõem hoje, está a reivindicação da condição de vítima. Que consiste basicamente no comportamento por meio do qual grupos ou indivíduos enunciam, antes de tudo, a opressão estrutural constante e severa que sofrem ou sofreram. Em seguida, estabelecido para todos os efeitos o fato da opressão estrutural, passa-se, de um lado, à tarefa de construção de identidade a partir desta condição: traça-se um círculo, dentro do qual estamos nós, as vítimas, e ao redor do qual estão os algozes, os indiferentes, os que não se importam, ou, enfim, os outros. Outra ação possível é a reivindicação de direitos derivados desta condição, o que vai desde direitos à reparação até simplesmente
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