A narrativa envergonhada de Sérgio Sant’Anna, por Cristovão Tezza
O escritor Sérgio Sant'Anna, em 2017 (Foto: Barbara Lopes/ Reprodução)
A edição de Contos e novelas reunidos e do romance Um crime delicado, do escritor carioca Sérgio Sant'Anna, é uma ótima oportunidade para acompanhar não só boa parte da trajetória desse autor, como também para avaliar uma vertente específica da literatura urbana brasileira dos últimos trinta anos, de que Sant'Anna é um dos mais importantes realizadores. Dois traços são distintivos, nessa rápida classificação: o primeiro é a ausência do sotaque regional ou social; a linguagem de Sérgio Sant'Anna é predominantemente "neutra", mesmo quando trata de segmentos sociais específicos; ela é urbana no que o mundo urbano tem de abstrato, mental, não enraizado no mundo das relações familiares ou típicas.
O outro traço é o fato de sua linguagem, em boa parte de sua obra, se realizar em narrativas desconfiadas, que só a contragosto se entregam à ilusão romanesca clássica. Em O sobrevivente, de 1969, seu livro de estréia, já temos um escritor completo - contos como "O albergue" e "Um par de dados", por exemplo, revelam plenamente que ali bate o coração da boa literatura. Ao mesmo tempo, o livro apresenta algumas das armas que serão a marca registrada do autor. O leitor muito apressado, por exemplo, desde esse primeiro momento ficará com o pescoço marcado pelos puxões da coleira sintática da frase de Sant'Anna, até que se deixe domesticar por uma sentença que sempre pede calma, e que, para esgotar o território reflexivo, se desdobra numa circularidade tranquila e distante.
Os contos se constroem por composições cumulativas de m
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