Volte sempre, Butler
Cartazes favoráveis a Butler no ato em frente ao Sesc Pompeia, que recebeu a filósofa nesta terça (7) (Reprodução/Petroneo Pepe)
As reações causadas pela presença de Judith Butler no Brasil acabaram mais marcantes do que o próprio discurso dela nas palestras proferidas ontem na Unifesp e hoje no Sesc. O embate travado nesta terça (7) em frente ao Sesc Pompeia foi um retrato bastante fiel da polarização que marca a moralização da política na atual conjuntura.
De um lado, um grupo pequeno, mas ruidoso de extrema direita. Eles, como já sabíamos, sabem jogar com as tecnologias e manipular as redes, de modo que conseguem produzir um efeito de pânico moral em torno desta agenda e de aparente hegemonia no senso médio da sociedade brasileira.
Evangélicos e católicos fundamentalistas, TFP, entusiastas da intervenção militar, apoiadores de Bolsonaro, sionistas, movimento Endireita São Paulo e adoradores das princesas e príncipes da Disney faziam coro contra a presença da Butler.
Não queriam debater com ela ou refutar seus argumentos (que eles sequer conheciam). Queriam mesmo era silenciá-la. Como não conseguiram, acabaram queimando uma boneca vestida de bruxa com uma foto de rosto da filósofa.
A violência e a truculência ficaram evidentes não apenas no campo simbólico. Xingavam Butler, Lula, FHC, Danilo Miranda e até George Soros, todos indistintamente colocados no mesmo balaio da “esquerda comunista”. Ameaçaram agressões físicas em diversos momentos.
De outro lado, uma vigília de diversos coletivos e movimentos sociais com o objetivo de defender o direito às liberdades de pensamento e de expressão, bem como o debate público sobre gênero e sexualidade. Felizmente eram a maioria hoje lá.
Desnecessário frisar quantas mulheres e pessoas LGBT sofrem diariamente violências físicas e morais por conta das marcas de gênero e sexualidade que atravessam e constituem seus corpos, razão mais do que suficiente para justificar o debate aberto do tema.
Ao contrário do outro lado, que apenas vociferava ofensas e agressões, do lado de cá, as falas tentavam explicar os sentidos da teoria queer, sua atualidade, a importância da diversidade na democracia, a necessidade de reconhecimento e garantia dos direitos reprodutivos e sexuais para todos e todas.
Equivocam-se, portanto, os que adotam um relativismo bastante cínico e perverso que toma ambos lados como faces equivalentes de uma mesma moeda. Os métodos, os propósitos, as reivindicações e as posturas não são os mesmos. São absolutamente diferentes e isso ficou muito claro para quem esteve ali hoje.
Foi ótimo que o embate político tenha, ao menos por hoje, saído das redes para a rua de modo a evidenciar as diferenças entre a intolerância da cruzada moralista e a defesa de valores básicos da democracia e da pluralidade. Butler, seja bem-vinda e volte sempre.