Morto há 50 anos, Frank O’Hara tem poemas publicados pela primeira vez no Brasil
O poeta Frank O'Hara em 1950 (Foto: George Montgomery)
Para pesquisadora, poeta ganha contornos especiais no país ao se aproximar dos modernistas brasileiros com sua dicção coloquial e a busca por espontaneidade
Na próxima segunda (22), será lançado, pela editora Luna Parque, Meu coração está no bolso (2017), primeiro livro de poemas do poeta norte-americano Frank O’Hara publicado no Brasil. Com tradução de Beatriz Bastos e Paulo Henriques Britto, o livro reúne 25 poemas de um dos principais representantes da Escola de Nova York nas décadas de 1950 e 1960.
Escritor voraz, O’Hara publicou apenas sete livros em vida, já que morreu precocemente aos 40 anos ao ser atropelado por um jipe na praia. Para a edição brasileira, Bastos escolheu seus poemas preferidos e que funcionavam em português, em sua concepção. Somados a poemas que Britto já havia traduzido, compuseram a seleção de 25 poemas de Meu coração está no bolso – o último deles, “Meu coração”, foi o único traduzido em conjunto pelos dois.
Professora de Literatura Comparada da Universidade de Binghamton, Luiza Franco Moreira afirma que os escritos de O’Hara são próximos aos dos modernistas brasileiros, já que, como eles, o poeta trabalha a dicção coloquial e busca um efeito de espontaneidade e imediatismo, além de ser ao mesmo tempo complexo e despretensioso.
Apesar disso, é apenas agora, 50 anos depois de sua morte, que o autor tem poemas publicados em português. Para a tradutora Beatriz Bastos, a demora se deu, principalmente, porque “se publica pouca poesia no Brasil, poesia traduzida menos ainda”. Ela cita como exemplo Ariel, de Sylvia Plath, de 1965, publicado no país apenas em 2007.
“Há outras razões, que não deixam de ser políticas, e que dizem respeito a quem domina o cenário das letras, tanto na academia como em um nível mais comercial. Os irmãos Campos [Haroldo e Augusto], por exemplo, elevaram o nível da tradução de poesia publicada aqui, mas os poetas da Escola de Nova York nunca estiveram entre os seus escolhidos”, afirma.
No próprio contexto norte-americano, como acredita a tradutora, O’Hara não foi valorizado imediatamente devido à sua ambiguidade. “Ele não tinha o fervor revolucionário e ‘anti-establishment’ dos poetas e escritores beat e tampouco seguia o estilo da poesia dominante da época, uma poesia mais cerebral e metafísica, herdeira de T.S. Eliot”, explica.
O poeta mítico
Nascido em 27 de março de 1926 em Baltimore, O’Hara era muito ligado ao cenário urbano e às novidades da época. Amigo de artistas plásticos como Fairfield Porter e Larry Rivers, trabalhou como curador do Museu de Arte Moderna de Nova York. Toda essa vivência artística ficou impressa em sua poesia, que se insurgiu contra divisões tradicionais em direção às artes plásticas, ao teatro e à música.
Trazer essa ambiência marcante de sua poesia foi um dos objetivos da tradução de Bastos, que acredita ter encontrado “um O’Hara possível em nossa língua”. Apesar de ser seu primeiro livro no Brasil, tanto a tradutora como a professora Luiza Moreira acreditam que ele já havia chegado ao país, principalmente em traduções que circulam abertamente pela internet. “É um poeta que está ‘no ar’ há algum tempo, mas que ainda não tinha sido totalmente apropriado por nós”, complementa Bastos.
“Sua poesia tem uma dicção que combina coloquialidade e lirismo. Ele escreve sobre a vida, sobre o amor, sobre a própria poesia, sobre a arte, sobre desejos, sobre andar na rua, sobre o ar, sobre tomar um café da manhã, uma coca-cola, sobre pelicanos, flores, ou sobre o dia em que Billie Holiday morreu”, opina Bastos. Para Luiza Moreira, a obra de O’Hara caracterizou-se principalmente pela inovação, “como se tivesse conseguido mudar as regras do jogo e expandir as possibilidades da poesia”.