Por um triz
Soldado em frente a detidos no Estádio Nacional, em Santiago (Foto: Koen Wessing/Hollandse Hoogte)
No 11 de setembro de 73 sou acordado por um voo rasante. Pensei: “Porra! Por que a essa hora?”. Tentei dormir de novo. Uns 15 minutos depois um segundo rasante me despertou. Aí caiu a ficha! “Aqui não é rota de avião! Nunca passou avião! É o golpe!”. Pulei da cama, liguei o rádio procurando as emissoras de esquerda. Quase todas já estavam fora do ar e tocavam marchas militares. Consegui localizar a rádio Magallanes. Pronto! Era o golpe.
Eu chegara ao Chile em junho de 1972, após ter permanecido preso no Presídio Tiradentes de 1969 a 1970 e de um período de clandestinidade que se tornara insustentável dada a precariedade da Ação Popular, organização na qual eu militava. Todos sabíamos que a direita tentaria um golpe e que ele estava por vir, mas, quando ele chega, a gente nunca está realmente preparado.
A rádio Magallanes anunciava que o Allende ia fazer um pronunciamento, as demais rádios já emitiam comunicados militares, anunciando o toque de recolher e dando um prazo até o meio-dia para que as pessoas voltassem para suas casas. Esperávamos notícias da resistência. Ouvimos o último e histórico discurso do Allende. Foi um discurso muito digno, mas que sinalizava a derrota imediata. Quando ele falou do porvenir, em que as alamedas de novo se abrirão, entendemos que a derrota estava dada. Não houve conclamação à resistência.
A partir do momento em que terminou o discurso, comecei a queimar todos os papéis subversivos que tinha. Uma amiga cortou meu cabelo e raspei a barba. Tínhamos uma banheira onde passei horas q
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