Os pássaros de Dickinson na era do Antropoceno

Os pássaros de Dickinson na era do Antropoceno
Gravura de gaios-azuis de John James Audubon, de sua série “Birds of America”, de 1830 (Imagem: National Audubon Society)
  Exceto por uns poucos meses, Emily Dickinson viveu toda sua vida em Amherst, Massachusetts, no vale do rio Connecticut, onde o bioma primário é a floresta decídua temperada, composta de carvalho, bordo, faia e olmo. Acima do dossel da floresta e escondidos em seu interior, esta­vam os pássaros selvagens do mundo de Dickinson, pássaros que ainda partem e rodopiam por entre seus poemas, cartas e fragmentos. Das mais de 500 espécies de aves que nidificam nesse vale fértil ou passam por ele, a poeta nomeou um número pequeno, apenas as que ouviu de sua janela ou observou em seu jardim – sabiás, triste-pias, pardais, gaios, corvos, águias, cardeais, papa-figos, cotovias, phebes, bluebirds, beija-flores, corujas, patos-êider, cisnes, whipporwills, perdizes, cucos, pombas, pintassilgos, e corruíras – e alguns que, em vez disso, devem ter sido avistados nas páginas de seus livros, como quero-queros, rouxinóis e pavões. No entanto, os pássaros povoam a obra de Dickinson. Seus fascículos abrigam tantos pássaros, que parecem ninhos; quando ela abandona a reunião dos poemas em fascículos para soltar folhas dobradas em duas abas, os pássaros migram também; e até mesmo seus últimos fragmentos carregam pássaros, ou se transformam neles. Assim como as aves estão sempre presentes em seus escritos, o canto dos pássaros é, sem dúvida, o som mais constante e evanescente que ela gravou por meio da escrita, em uma época anterior à invenção das tecnologias de gravação. A produção do som das aves também é a produção de lugares: orient

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