oficina literária | Tânia
(Arte: Fernando Saraiva)
Na vigésima quinta vez que Luciana entrou na delegacia para dar parte de Tânia, disse um monte de mentiras. Falou que Tânia perturbava, que escutava música até altas horas da noite, um absurdo, que dava para o prédio inteiro e depois ficava fumando no corredor só de baby-doll, dizendo palavrões. Mandou constar nos registros oficiais que Tânia tirava fotos pela janela, usando o zoom, enquanto despia a calcinha. E que depois passava a foto por debaixo da porta. Cópias assinadas, mantinha consigo as originais. Uma mulher pornográfica. Tinha provas: uma coleção de retratos pixelados de sua vagina.
Mas nem pareciam vaginas, eram manchas cor-de-rosa borradas. Que Tânia saía pela calçada sangrando feridas, atrapalhando a rua, escandalizando as pessoas. Talvez fosse menstruação. Ninguém com a coragem de perguntar, imagina aquela visão, quem é que gosta de esbarrar numa mulher pingando sangue, sem higiene. Tem de ser presa. Como é que uma pessoa dessas pode ficar em liberdade?
Inimiga dos animais, extinguira, com um gesto de mão numa quarta-feira, todos os rinocerontes pardos da Eritreia, causando um desequilíbrio no ecossistema do mundo. Tânia, violenta e agressiva. Olhou Luciana direto nos olhos e disse: Deu vontade de matar. De matar. Agora. Só não disse: você. Deu vontade de matar agora. Você. Ou: Deu vontade de matar você. Agora. Deixou subentendido, ameaçava de um jeito velado, assustava falando baixo.
Homicida desalmada, sufocou, utilizando toalhas quentes de poliéster, o próprio filho pequeno. Mandou subornar as testemunhas,
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