Oficina literária – Robinson chorou
Sentado sobre a areia em sua clareira preferida, Robinson, debilitado pela dieta à base de frutas e tubérculos, com o corpo arqueado e os braços estendidos entre as pernas abertas, mirava o cume da montanha. Pensava em sua morte em vida isolado naquela ilha. Sentia uma angústia enorme sabendo-se prisioneiro daquela natureza exuberante cujo único propósito – lhe parecia – era resistir como um David ao Golias oceânico que açoitava seus paredões e estendia ao máximo sua língua espumante em suas praias, lambendo as palmeiras, minando as raízes, sugando palmas mortas, cascas e míseros gravetos para sua descomunal goela; depois, regurgitava-os, pilhados de seu sumo.
Este mesmo Golias o deixara ali e, com a paciência dos deuses, aguardava seu retorno. Zombava ao lhe ofertar troncos robustos, águas plácidas e transparentes a exibir minúsculos peixinhos indolentes; ria de seu medo; brincava entre as pedras de pegar seus pés; de açoitar seu peito com suas vagas; divertia-se em testar seus músculos com seu traiçoeiro repuxo; de acordá-lo à noite com estrondosos bofetões na areia.
Do outro lado desse gigante – suspeitava Robinson –, familiares e amigos lentamente o sepultavam nas tarefas cotidianas; seu rosto pouco a pouco diluía-se em suas memórias; vez que outra reivindicavam sua alma ao ler sobre naufrágios no longínquo pacífico.
Não suportando a ideia de existir somente para si, chorou.
Ramon Berta Wayne – Natural de Cruz Alta (RS), atualmente reside em Porto Alegre. Publicou contos em antologias, escreve roteiros e peças de teatro. Como dramaturgo, recebeu os prêmios Funarte de dramaturgia, Sesi e Instituto de Artes Cênicas/Detran.