O rodamoinho de 1968

O rodamoinho de 1968
“Submeter-se ou resistir e vencer”, cartaz concebido coletivamente, em maio de 1968 (Reprodução)
  Enquanto leio Maio de 68: a brecha, é forte a impressão de que não estou em parte alguma, isto é, de morarmos na Utopia; de que não estou em tempo algum, de habitarmos a Ucronia. Oportunidade inaudita? Possivelmente. Com Edgar Morin, o leitor estaria em toda a parte respirando, a plenos pulmões, os ares de uma longa e sinuosa duração, desde a pré-história dos movimentos estudantis e populares até o momento em que reaparecesse, sob feições liminares, o rosto inquietante das massas perigosas. Como também acontece ao leitor de cair no sono, pode seguir folheando páginas impressas em sonho, vestígios noturnos que têm voz ativa num livro que, ademais, é belo e muito bem cuidado: pode até manter ao seu redor, entrelaçados em espiral, o fio de suas horas rotineiras, meses de um calendário inteiramente outro, um ano que persevera em não terminar. Mas eis que ao se dar por desperto, seria preciso encontrar um sinal que lhe apontasse a cidade. São Paulo? Madri? Roma? Nanterre? Paris? Praga? Seria preciso encontrar ao menos um indício que lhe designasse que horas são nesse Elemento Político (ainda com maiúsculas), o que respondia pelo nome de Imaginação. Recordações de leitura, em todo caso, não sustentam o passado como cronologia. Atravessam, simplesmente, regiões qualitativas de uma contestação admirável. Uma vez desvelada a brecha, compreende o leitor que, nela, não se pedia a reforma do poder assim como 
não se tinha a menor pretensão de ocupá-lo. Com Marilena Chaui e Guy Debord, Olgária Matos não nos deixa esquecer de

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