Privado: A ilha poética de Jorge de Lima
Num ensaio em que comenta a poesia de François Villon, o crítico Antonio Candido, em sua mescla de memória e comentário, recorda o impacto que sentiu ao ler “Os lamentos da bela armeira”. Leu, na verdade, num livro de entrevistas de Rodin, no qual o pintor dizia: “na arte, é belo apenas o que tem caráter”. A certa altura de seu texto, diz Candido que ficou impressionado com o “poder da palavra”. “Cada um de nós se sente revolvido até o miolo, abalado até o miolo pela vibração de incríveis campos magnéticos”.
Essas observações talvez caibam para a leitura de Invenção de Orfeu, do poeta alagoano Jorge de Lima, mais conhecido hoje por seus poemas modernistas, como o bastante popularizado “Essa Nega Fulô”. Publicado em 1952, um ano antes da morte do poeta, essa “biografia épica”, como ele mesmo a designou, continua hoje a desafiar o leitor. Não há dúvida de que se trata de um livro de altíssima voltagem poética, com uma potência onírica, onde a palavra – que se alça ao primeiro plano do livro – tem um poder incrível, apesar dos altos e baixos da fatura geral da obra.
Com 10 cantos, inspiração confessa de Os Lusíadas, de Camões, e 11 mil versos, como o próprio Jorge de Lima frisava em suas entrevistas, este longo poema tem algo de monumental, de ambicioso em sua formulação. E, ao mesmo tempo, de intrigante, já que nele o poeta, que nadou em várias águas – do parnasianismo juvenil ao regionalismo modernista, passando depois por uma fase religiosa, ao lado de Murilo Mendes, numa releitura brasileira do surreali
Assine a Revista Cult e
tenha acesso a conteúdos exclusivos
Assinar »