“A grande tendência à rapina”

“A grande tendência à rapina”
A escritora Clarice Lispector (Foto: Arquivo Manchete)
  Olhou-me rápido, e era a inveja, você tem tudo, e a censura, porque não somos a mesma , e a cobiça – ela me queria para ela. Clarice Lispector Uma mulher adulta é motivo de complexas reações ao interagir com uma criança de nome Ofélia, sua vizinha de apartamento, figura estranha que a visita várias vezes. Por quê? Para quê? Eis um eixo da ação do livro A legião estrangeira, de Clarice Lispector, publicado pela Editora do Autor em 1964, ano em que também é lançado o romance da mesma autora A paixão segundo G. H. Na verdade, o núcleo da trama tem como foco uma relação não a dois – a adulta e a criança –, mas a três: além das duas – a narradora sem nome e a menina Ofélia –, há outro personagem, um pinto. É preciso considerar ainda as circunstâncias em que essa ave aparece no apartamento da mulher adulta, personagem que narra a história, e o fato de que, na verdade, há duas personagens-aves, dois pintos: o de um passado mais recente – o dia de “hoje” da narradora – e o de um passado mais remoto. Ao ver um pinto “hoje”, véspera de Natal, a narradora se lembra daquele outro, cuja história compõe a segunda parte da trama, protagonizada pela menina Ofélia. Aspectos intrigantes subsistem em A legião estrangeira. Como se constrói esteticamente essa narrativa pautada na relação entre a mulher adulta, a criança Ofélia e as duas aves? Como o desenho de um sutil e detalhado repertório imagístico, calcado em recursos da ficção policial, acaba por mapear os meandros da mente humana na experiência do

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