Fisiologismo e burrice
Edição do mês
No final de 2005, veio a público, pela editora Companhia das Letras, o livro O mundo não é chato, organizado pelo poeta Eucanaã Ferraz, reunindo toda a prosa crítica de Caetano Veloso, desde a “juvenília” – os artigos sobre cinema para o jornal santo-amarense O Archote – até os dias de hoje, incluindo ainda dois textos inéditos. É o fato de o livro haver obtido escassa repercussão crítica que se mostra convidativo à análise; trata-se de algo cuja compreensão revela aspectos importantes do ambiente cultural brasileiro.
Deve-se deslindar a complexidade do problema, a fim de poder chegar ao que é, nesse caso, mais específico. É um equívoco pensar que há um trânsito de consumo da canção para o pensamento crítico ou literário, e exigir um tal movimento é uma reivindicação deslocada: o adolescente que gosta de Legião Urbana não necessariamente procurará ler Camões. O mesmo se aplica à defasagem entre os ouvintes do cancioneiro de Caetano e os leitores de sua prosa crítica. Mas perceber isso como uma espécie de limitação da canção popular leva a uma grave incompreensão quanto a seu lugar na cultura brasileira: pois o que importa é a força crítica e a inventividade estética da canção em si – e não que ela cumpra um papel propedêutico, uma espécie de ensino médio cultural ou curso preparatório para a “alta cultura”.
Assim, é a falta de repercussão intelectual que dá azo a uma interpretação do jogo de forças da cultura brasileira contemporânea. Pois a escassez de debate crítico em torno do livro v
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