Festival de Cannes 2024: “Anora”, de Sean Baker vence a Palma de Ouro
Cena de "Anora". Divulgação
Parecia uma das Palmas de Ouro mais incontestáveis em anos, mas o júri do Festival de Cannes 2024 surpreendeu. O troféu máximo do evento foi conferido ao longa Anora, do estadunidense Sean Baker – filme bastante elogiado, mas que foi eclipsado no último dia de exibição, quando o iraniano The Seed of the Sacred Fig, de Mohammad Rasoulof, se tornou uma unanimidade crítica, ainda mais em um ano de qualidade muito discutível como este.
O júri comandado pela atriz e cineasta estadunidense Greta Gerwig laureou a trama sobre uma prostituta que cai nas graças de um jovem milionário. O rapaz se empolga tanto com sua nova paixão que a leva a Las Vegas e ali troca alianças com ela, mesmo a conhecendo há apenas poucos dias. Mas o sonho de Anora de conseguir estabilidade financeira e afetiva se esvai quando a família conservadora do garoto intervém e faz de tudo para anular o casamento.
O segundo troféu mais importante, o Grande Prêmio do Júri, foi para All We Imagine as Light, da indiana Payal Kapadia. É uma celebração de Mumbai, com foco nas experiências urbanas de duas mulheres que moram juntas na cidade. O troféu de melhor direção foi para o português Miguel Gomes, por Grand Tour, filme que intercala imagens documentais sobre a Ásia atual com trechos ficcionais sobre um casal de britânicos em crise, durante uma viagem ao extremo Oriente, no começo do século 20.
O Prêmio do Júri foi para o melodrama musical Emília Pérez, do francês Jacques Audiard, que se passa no México, mostrando um traficante de drogas poderoso que se submete a uma cirurgia de redesignação sexual. O filme também garantiu à atriz transsexual espanhola Karla Sofía Gascón e às colegas de elenco Zoé Saldaña, Selena Gomez e Adriana Paz um prêmio coletivo de atuação feminina – foi a primeira vez que uma pessoa trans foi laureada em Cannes. Entre os atores, o estadunidense Jesse Plemons foi agraciado pela sua performance em Kinds of Kindness, do grego Yorgos Lanthimos, em que interpreta três personagens distintos.
O prêmio de melhor roteiro foi para a sátira sobre etarismo The Substance, escrito e dirigido pela francesa Coralie Fargeat. E como consolação para Mohammad Rasoulof, o iraniano condenado à prisão em seu país, mas que fugiu de Teerã e foi a Cannes apresentar The Seed of the Sacred Fig, sobre a truculência policial e os excessos da ditadura no Irã, levou um prêmio especial, categoria não prevista na premiação, mas uma evidente forma de o júri não ficar tão mal assim na opinião pública.
O fato é que 2024 foi um dos anos mais fracos em termos de qualidade dos concorrentes ao prêmio principal. Com exceção do longa de Rasoulof, nenhum outro de fato teve uma ampla aceitação entre a crítica e o público. A vitória de Anora não foi 100% injusta, mas será para sempre lembrada como um equívoco do júri liderado por Gerwig. E pela falta dos jurados de algo que sobrou ao cineasta iraniano: a ousadia.
Confira abaixo os vencedores do Festival de Cannes 2024.
Palma de Ouro: Anora, de Sean Baker;
Grand Prêmio do Júri: All We Imagine as Light, de Payal Kapadia;
Prêmio do júri: Emilia Pérez, de Jacques Audiard;
Direção: Miguel Gomes, por Grand Tour;
Ator: Jesse Plemons, por Kinds of Kindness;
Atriz: Karla Sofía Gascón, Zoe Saldaña, Selena Gomez e Adriana Paz, por Emilia Pérez;
Roteiro: Coralie Fargeat, por The Substance;
Prêmio Especial: Mohammad Rasoulof, por The Seed of the Sacred Fig.
Bruno Ghetti é jornalista e crítico de cinema