É o futuro, Jorge?
Detalhe da obra “Cantos de esquinas” (2019), de Maxwell Alexandre
Nos tempos que correm, na área do teatro brasileiro, “declarações de si” se tornaram obrigatórias. Quase um passaporte informal, um salvo-conduto para você carregar no bolso e sacar diante do primeiro guarda de fronteira que cruzar o seu caminho. Não há edital, concurso público, pelada, jogo de cartas em que o seu “EU” não tenha de ser – vorazmente – o verdadeiro objeto da questão. “Olá, vim apresentar um trabalho. Com um argumento racional, claro, se possível…”. “Calma lá, onde você pensa que vai?” (silêncio) “Vamos! Diga-me com quem andas!” E, assim, caímos de planilha em planilha na falácia que Sócrates achava mais perniciosa: “o discurso ad hominem” (aquele que fala da pessoa, mas não de suas intenções). “Quem é você, para pensar em dizer o que diz, ãnh?”
Bem, não trairemos os costumes. Em Roma, aja como os romanos. Tentaremos ser fiéis a nós mesmas, por mais que tenhamos nos mudado de cidade, estado, país, estado civil, cor de cabelo, número de sapato, RG, religião e preferências (se é que você me entende). Avante, a primeira: eu me chamo Jussilene Santana do Nascimento Gadelha, sou atriz e fundadora do Instituto Martim Gonçalves, e declaro para os devidos fins deste artigo que nasci branca, loira, de olhos verdes, no morro da Formiga de São Caetano, bairro negro e periférico de Salvador, onde fui criada até os 24 anos, pelos meus pais: seu Mamédio, um comerciante de farinha e verduras, e dona Lourdes, “do lar” e cozinheira.
Com meu único irmão, Mamédio Júnior, habitávamos
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