Dica de leitura sobre nosso mundo vendido
Fico feliz de ver o Filosofia Brincante na Angola sendo lido por garotos que falam a nossa língua. Agradeço ao Maurício Leite que o levou pra lá e me enviou essas fotos. Mas notem a camiseta da Abercrombie entre as roupas rotas dos meninos. O que ela denuncia?
Ando lendo “Sem Logo – a tirania das marcas em um planeta vendido” (ed. Record, 2009) da Naomi Klein.
O livro foi publicado no ano 2000 no Canadá. Demorou pra chegar aqui, mas ainda vale muito entregar-se ao que ele mostra. O lado religioso do capitalismo que são as marcas. As marcas são o mecanismo de lavagem cerebral geral em nossa sociedade afundada na barbárie da guerra de ricos contra pobres. Não estou falando da classe média, estou falando de ricos, aqueles que tem mais do que tudo enquanto o resto não tem nada. A lógica que funda este tudo e nada está plantada não apenas no que chamamos abstratamente de injustiça social, mas em maldade, em ódio de uns contra outros, na lógica fascista da economia capitalista com tudo o que ela tem de cínico. Refiro-me ao cinismo que entrelaça algozes e vítimas, mentirosos e otários.
Digam-me, depois de lê-lo, se é possível aceitar esse projeto genocida a que chamamos de capitalismo amparado nos ícones religiosos que são as marcas? Esse nosso mundo cindido entre quem tem tudo e quem não tem nada… E de vez em quando um resto desse lixo religioso escapa ao shopping e vai parar na favela. Como se um deus qualquer, um santo, estivesse, de repente, solto na rua…
Só para a gente ir pensando, por enquanto.
(12) Comentários
Quem dera chegasse o dia em todos percebessem que a leitura abre horizontes, caminhos, chãos, céus. Infelizmente, as tecnologias do mundo contemporâneo fizeram com que muitas pessoas deixassem a leitura de lado, o que resultou em jovens cada vez mais desinteressados pelos livros, possuindo vocabulários e mentes cada vez mais pobres. A leitura é o anti-capitalismo e, justamente por isso, é tão desprezada nessa sociedade que se deixa levar pelo consumo estimulado. Mas cabe a nós, educadores, mudar tal situação. Dar o primeiro passo é fundamental para que possamos colher bons resultados. Como disse Milton Nascimento: “Se o poeta é o que sonha o que vai ser real, vou sonhar coisas boas que o homem faz, e esperar pelos frutos no quintal.”
pois é… eu de novo encucada com essa questão da religião… eu fico pensando se realmente há um AMPARO nos ícones religiosos… eu às vezes acho q é apenas uma tentativa de parecer correto, certinho, para q ninguém veja, por exemplo, esse ricos q vc cita, como “errados”. Eles querem ter sossego para fazerem o q querem. Então acho q botam a mão rapidinho nos ícones (como uma beata poria a mão rapidinho na medalha se visse o diabo na frente). Mas eu acho q esses ícones são só para esses momentos, pq ninguém usa o feriado santo para idolatrar o santo. O feriado é para ir para a praia ou para o shopping. Não vejo nada religioso no sentido q vc usou, nessa hora… o santo, a religião é o dinheiro nessa hora. O q vc acha???
Nem tanto nem tão pouco, I want a mind that can handle 100 year of thought, of loneliness, of despair and of love for human intelligence.
De acordo com o texto. Mas comento a foto: que maravilha! Vou adquirir o Filosofia Brincante e ler pro Érico…
O teu só não chegou porque eu sou uma anta demorada, espera que já tá no envelope. beijos
Estou lendo desde Janeiro, aos poucos, misturado com outros. ´Muito bom!
Assim sendo, viva o anarquismo ou o anarco-comunismo como prefiro!
Um dos garotos usando a camiseta da marca Abercrombie,denuncia a força do capitasmo em um mundo permeado por injustiças socias.
A “Filosofia Brincante” seria uma forma de despertar neles o senso crítico para as mazelas da vida,e assim começar a reescrever a sua história.
Mas faltaram meninas na foto…!!
“dizem que em cada coisa uma coisa oculta mora. Sim, é ela própria, a coisa sem ser oculta, Que mora nela.” Alberto Caeiro.
Essa foto (……………………………………..)
Fiquei contente ao passar por aqui, picho esse comentário com a mesma tinta vermelha que compartilho com você.
Beijos
O filosofo e sua luz.
Bravo!
Vale muito relembrar Drummond:
Eu, etiqueta
Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome… estranho
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, premência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-lo por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer, principalmente.)
E nisto me comprazo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou – vê lá – anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar,
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo de outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mar artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome noco é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.
(Carlos Drummond de Andrade)
e Adorno:
Ela ( a propaganda para Adorno, mas também e principalmente as marcas, que são a única razão de ser da propaganda) fixa o modo de ser dos homens tais como eles se tornaram sob a injustiça social, na medida em que ela os coloca em movimento. Ela conta com o fato de que se pode contar com eles. No íntimo, cada um sabe que ele próprio será transformado pelo meio num outro meio, como na fábrica.
Existe perda de identidade mais significativa e aviltante do que um índio posando de bermuda adidas para esconder as ‘vergonhas’?