Dando corpo ao impossível
Dom Quixote, Ilustração de Gustave Doré, 1868 (Arte Andreia Freire)
“O que poderia ser a necessidade para tal revolução linguística se demonstrarmos que a linguagem existente e sua estrutura são fundamentalmente adequadas às necessidades do novo sistema? A antiga superestrutura pode e deve ser destruída e substituída por uma nova no curso de alguns anos, a fim de dar livre curso ao desenvolvimento das forças produtivas da sociedade, mas como poderia uma linguagem existente ser destruída e uma nova construída em seu lugar no curso de alguns anos sem causar anarquia na vida social e sem criar a ameaça de desintegração da sociedade? Quem a não ser um Dom Quixote poderia dar a si mesmo tal tarefa?” Stalin, Marxism and linguistics.
Estas são palavras de Josef Stalin a respeito de um debate que marcou época na antiga URSS. A questão girava em torno da relação entre linguagem e revolução. Uma revolução política modifica ou não a estrutura da linguagem? Seria a linguagem uma superestrutura transformada quando rupturas sociais fundamentais ocorrem? Como se vê, a resposta de Stalin é negativa. A vida da linguagem passa ao largo das transformações econômicas e sociais. Ele parece ter uma espécie de neutralidade política. Pois destruir uma linguagem existente e construir uma nova em seu lugar só poderia implicar a anarquia da vida social e a ameaça de desintegração da sociedade.
No entanto, de certa forma, Stalin tinha razão. Há uma anarquia, uma quebra da arché, uma eliminação da ilusão da origem e do fundamento quando uma linguagem entra em dinâmica de ruptura. Poderíamos partir desse po
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