Aos 78 anos, Helena Ignez volta ao teatro e se prepara para lançar sétimo filme

Aos 78 anos, Helena Ignez volta ao teatro e se prepara para lançar sétimo filme
A atriz e diretora Helena Ignez (Foto: Leo Lara/Universo Produção)

 

A voz grave com forte sotaque baiano não deixa adivinhar a idade de Helena Ignez. Nem isso, nem sua visão de mundo – atual e nada conservadora. A atriz e diretora, um dos grandes nomes do Cinema Novo e do Cinema Marginal, completou 78 anos na última terça (23) sem dar mostras de diminuir o ritmo de trabalho.

Em agosto, ela estreia no elenco da peça Tchekhov é um cogumelo, de André Guerreiro Lopes, no Sesc Consolação; e no final do ano volta à direção com o filme A moça do calendário, que traz roteiro do cineasta Rogério Sganzerla (1946-204), com quem foi casada durante 35 anos. 

“Agora que já aprendi tanto, que já passei por tanta coisa, não posso parar de produzir cultura. Ainda mais em um momento como o que vivemos, de um conservadorismo que tem dominado e envenenado o país”, diz a atriz e diretora.

Depois do sucesso no Brasil nas décadas de 60 e 70, Ignez atuou internacionalmente, inclusive na Europa e na África; foi dirigida por nomes importantes da Broadway e, mais tarde, saiu com facilidade de seu papel de atriz para tentar, com sucesso, a sorte na direção – tanto que, no ano passado, foi homenageada na 20º Mostra de Cinema de Tiradentes por sua recente produção, o filme Ralé.

Logo no início da carreira, ganhou duas vezes o prêmio de melhor atriz no Festival de Brasília: em 1966, por O Padre e a Moça (Joaquim Pedro de Andrade) e em 1969, por A Mulher de Todos (Rogério Sganzerla), produção que ela considera seu melhor trabalho.

“Acho A Mulher de Todos um filme extraordinário, me identifico com Ângela Carne e Osso [personagem que interpreta] porque ela é revolucionária. Quer dar as regras do jogo, algo que não era comum na época em que comecei a atuar”, diz.

No filme, Sganzerla mostra uma mulher sexual, no comando, que faz os homens de gato e sapato. “Ela é uma mulher atual”, define Ignez, e não fica claro se fala de si mesma ou da personagem. Coincidentemente, a obra estreou junto da ebulição do feminismo nos anos 1960, em meio a debates sobre libertação sexual e uso de métodos contraceptivos modernos. 

Ainda assim, Ignez diz que a profissão de atriz não era reconhecida naquele momento. “A própria Fernanda Montenegro dizia que trabalhava como ‘doméstica’ porque a palavra ‘atriz’ era escandalosa demais para a época”, recorda. 

Helena Ignez em “A Mulher de Todos”, de Rogério Sganzerla, 1969 (Foto: Peter Overbeck)

Mulher de si mesma

Nascida em Salvador há 78 anos, Helena veio de uma família “liberal”, como ela mesma caracteriza. Entrou na UFBA – onde cursou Arte Dramática – em 1958, logo no início de uma onda artística que varreria Salvador nos anos seguintes: “Foi uma eclosão muito grande de cultura, especialmente no teatro, dentro de uma cidade provinciana”.

No meio dessa efervescência cultural, ela conheceu Glauber Rocha, um homem que diz ter sido o “único na Bahia que ela sentiu que poderia amar muito naquela época”. Os dois estrearam juntos no cinema, com o curta O pátio (1959), seguiram carreira na área e se casaram. Da união, nasceu a atriz Paloma Rocha, mas poucos anos depois o casal se divorciou: “Eu sentia que as pessoas só queriam ouvi-lo, e a mim, apenas admirar a beleza. Eu achava horrível me sentir daquela maneira.”

A separação não tirou a carreira de Ignez dos eixos. Ao contrário: ela continuou fazendo sucesso, com A Grande Feira (1961), Assalto ao Trem Pagador (1962) e O Padre e a Moça (1966). Em 1968, foi chamada para participar de O Bandido da Luz Vermelha na pele da personagem Janete Jane. E foi ali, no set, que conheceu Rogério Sganzerla. “Até hoje ele é um mestre para mim. Vejo os filmes dele com uma surpresa a cada vez.”

A partir da relação com Sganzerla, Ignez se tornou um dos nomes mais marcantes do Cinema Marginal, filmando, em dois anos, doze filmes. Em 2004, Sganzerla morreu e deixou um “baú cheio de roteiros”, segundo a atriz. Foi aí que a sede de dirigir apareceu.

“Eu já havia dirigido peças de teatro, então dirigir filmes não foi um desafio tão grande”, conta. Tomou para si a produção de Luz nas Trevas – A Volta do Bandido da Luz Vermelha (2010), continuação de O Bandido da Luz Vermelha, que o marido tinha escrito antes de morrer. “O teatro me deu a régua e o compasso para o cinema. Hoje, eu gosto que os críticos dizem que eu sou a única diretora com vertente teatral”.

Para a cineasta, o desmonte da cultura no Brasil traz tempos difíceis para quem trabalha na área: “Eu não ouvi falar em arte nas discussões políticas. Falta incentivo para tudo na arte e a produção está estrangulada”. Fã de Tata Amaral  – diretora de Antônia, De Menor e Hoje -, ela acredita que as mulheres têm o poder criativo para tirar o país do marasmo artístico: “Quando uma mulher se afirma, ela afirma muitas outras. E juntas saímos do buraco”.

(1) Comentário

  1. TRABALHEI DURANTE MUITOS ANOS. COMO. OPERADOR CINEMATOGRAFICO E O MEU MAIR DESEJO E CONHECER ESSA GRANDE ATRIZ E CINEASTA HELENA IGNEZ….SOU DO RJ E TENHO HOJE 56 ANOS SOU NATURAL DE SAO PAULO E ESSE E O MEU SONHO DE UM DIA PODER CONHECER ESSA GRANDE CINEASTA E ATRIZ
    Tel. Contato 21-982074223…..

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