Antologia

  1. Victor Heringer, André Monteiro, Annita Costa Malufe, Marília Garcia, Heyk Pimenta, Pádua Fernandes, Laura Erber disse:
Antologia
Victor Heringer Não sou poeta Agora que os estalos da adolescência passaram e a vida assenta como uma cômoda de mogno agora que os joelhos estalam quando me levanto sem mulher, sem filhos, mas com emprego estável é preciso admitir que não sou poeta. Embora o meu amor esteja solto no mundo violento, semicego e ferido no ombro não sou poeta. Todos me felicitam. Que bom, dizem vida de poeta é muito difícil. Logo a gente chega a ser homem e acaba com as coisas de menino. A vida afunila. Eu tinha dois, três truques nos bolsos de calças compradas em shoppings. Não soube nunca comprar como poeta a longa espera por um par de sapatos sentinela no deserto. Os sapatos são fabricados e os pés dos poetas passam anos se deformando. Até que um dia cabem. Por isso qualquer roupa parece velha no corpo de um poeta. Por isso estão sempre se desculpando pelas roupas velhas. Mas em segredo se orgulham. Embora eu tenha um corpo que pode ser confundido com o corpo de um poeta não sou poeta. Tenho as pernas fortes e os braços magros. O torso amolecido dos boxeadores os órgãos de dentro estropiados. Mas quem me vê nu instintivamente sabe que não sou poeta. Não levantei a mão esquerda em golpe de dançarina de flamenco ao ler Jaime Gil de Biedma para os meus amigos, embora tudo tenha conspirado para isso. Para que se me entranhassem as coisas. Concluo que não sou poeta. Tenho os dedos frios de um técnico em informática e sou triste como um técnico em informática mas não sou tão triste quanto um barbeiro. Eu li todos os tratado

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