A Constituição e o canto das sereias
Jürgen Klauke, Melancholie der Stühle II, 1980-1981 (Arquivo pessoal)
O jurista Stephen Holmes, em 1995, tentou lidar com um problema recorrente nos Estados Unidos: por que respeitar e fazer cumprir uma Constituição que fora escrita 200 anos antes? Ora, se até os religiosos releem a Bíblia admitindo uma adaptação ao nosso tempo, como pode uma Constituição escrita a pena e vela permanecer rígida por séculos e ainda comprometer a geração de comentadores de Facebook ao ar-condicionado?
A resposta foi a seguinte: “Os cidadãos precisam de uma Constituição, da mesma forma que Ulisses precisou ser amarrado ao seu mastro. Se fosse permitido aos eleitores conseguirem tudo aquilo que querem, eles inevitavelmente naufragariam. Ao atarem-se às normas rígidas, eles podem evitar tropeçar em seus próprios pés. O constitucionalismo, sob essa perspectiva, é essencialmente antidemocrático. A função básica de uma Constituição é remover certas decisões do processo democrático, isto é, atar as mãos da comunidade.”
É preciso muita coragem em qualquer país ocidental livre para enunciar e defender que uma Constituição tem uma carga “antidemocrática”, mas entenda-se o sentido aqui como sendo “contra majoritária”. Este é o eterno e tão debatido paradoxo: não queremos uma democracia que permita a abolição da própria democracia. E é para isso que serve, fundamentalmente, uma Constituição: para nos manter distantes do canto das sereias.
Não há aspecto mais ilustrativo sobre o tema do que os direitos fundamentais. De tempos em tempos (e especialmente nestes dias em que vivemos), é importante que se
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