Privado: A ferida aberta do presente

Privado: A ferida aberta do presente
Julián Fuks Foi por um princípio de incerteza, pela noção de uma insuficiência, que o romance como gênero retirou a primazia que costumava dar ao passado e a entregou ao presente. Num dado momento que começa a se perder no tempo, seus narradores preferiram desatender as ações pretéritas e perseguir o instante, acossando suas vicissitudes, destramando seus enredos, tratando de ocupar com palavras a duração dos acontecimentos. Era o sensível fracasso de seus empenhos anteriores o que pautava essa divergência: nos volteios do passado, mesmo nos meandros de uma trajetória pessoal, o protagonista não conseguia mais se reconhecer, não conseguia desvendar sua essência. Voltando-se às minúcias do presente, então, investigando os atos em seu exato ensejo, talvez conseguisse enfim alcançar alguma revelação de caráter, alguma identidade vigente. Quem fica sabendo que Passageiro do Fim do Dia, o novo romance de Rubens Figueiredo, relata em tempo fiel um trajeto de ônibus do centro ao subúrbio, quem verifica já nas primeiras linhas a virtuose com que o autor descreve o ângulo oblíquo em que o sol cor de brasa incide sobre a testa dos que anseiam pela partida, pensa logo estar diante desse tipo de narrativa. Nas quase 200 páginas que se seguem, o leitor prognostica, será brindado com cada gesto e cada pensamento do sujeito em que se centram as atenções, Pedro, o passageiro protagonista. Havendo algum paralelismo com as demais obras da espécie – e é o que a sinopse da editora indica –, a profusão de detalhes aparentemente arbitrários acabará

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