Notícias de outras ilhas: Júlia Rocha e Gustavo Galo

Notícias de outras ilhas: Júlia Rocha e Gustavo Galo
(Foto: Arquivo Pessoal)

 

Júlia Rocha e Gustavo Galo fazem parte da É Selo de Língua, pequena editora responsável por livros, cartazes, programas de áudio (bocaboca), transmissões ao vivo (ALIVE) e mais recentemente pela c h e i a, publicação mensal realizada em parceria com o selo treme~terra.

Para a seção “Notícias de outras ilhas” – em que poetas, escritores e tradutores sugerem leituras para o período da quarentena –, indicam poemas de Judith Malina e Diane Di PrimaA curadoria é de Tarso de Melo. Leia os poemas e o comentário do casal abaixo.

 

Traduzimos um trecho de “Full moon diary” (janeiro-junho de 1970), texto escrito de 1964 a 2014 por Judith Malina. A cada lua cheia, neste intervalo, a artista anarquista (inventora do the living theatre), escreveu brevemente, de três a cinco linhas, sobre aquilo que a envolvia, de planos de ação direta, passando por montagens teatrais, festas, amantes, prisões, uma delas no brasil, em 1972, acusada de subversão e tráfico de drogas pela ditadura civil-militar.

Quem nos apresentou o texto foi Ilion Troya. Foi também Ilion o tradutor do segundo trecho que apresentamos, extraído de O trabalho de um teatro anarquista”, pronunciamento de Malina do início dos anos 1990 e que publicamos na c h e i a, como uma conversa, ao lado de “Inverso”.

O terceiro poema é a “Carta revolucionária #7”, de Diane Di Prima, texto que pertence à série de 63 cartas publicadas pela primeira vez pela City Light Books em 1971. Aqui, em tradução de Rodrigo Lobo, a poeta também anarquista, como Judith Malina.

 

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full moon

Judith Malina

JANEIRO
Durante a lua cheia, em janeiro, encontro
da Célula de Ação, em Croissy, na casa de Pierre Clementi,
planejando um novo trabalho.
FEVEREIRO
Durante a lua cheia, em fevereiro, encontro
da Célula de Ação, em Croissy, na casa de Pierre Clementi,
novos planos e conversas sobre
ideologias da revolução e a violência.
MARÇO
Durante a lua cheia, em março,
trabalho em Croissy, fazendo planos para
a America do Sul e um filme.
ABRIL
Durante a lua cheia, em abril, seguimos
desesperados, doentes e com gripe,
o trabalho em Croissy,
MAIO
Durante a lua cheia, em maio, seguimos
em Croissy, trabalhando.
JUNHO
Durante a lua cheia, em junho, ainda estávamos
em Croissy, gritando para cair fora.

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***

carta revolucionária #7

Diane Di Prima

há aqueles que podem te dizer
como fazer coqueteis molotov, lança-chamas,
bombas o que quer que
você precise
encontre-os e aprenda, esclareça
sua meta, escolha sua munição
com isto em mente

não é uma boa ideia carregar revólver
ou faca
a não ser que você saiba muito bem como usá-los
todas as espadas têm dois gumes, podem ser usadas contra você
por quem quer que possa tomá-las de você

é
possível até mesmo na costa leste
encontrar um lugar isolado para treinar a mira
o sucesso
vai depender sobretudo do seu estado de espírito:
medite, reze, faça amor, esteja preparado
para morrer a qualquer momento

mas não esquente: não são
as armas que vão vencer, elas são
uma parte incidental desta ação
na qual é bom que sejamos bons,
o que vai vencer
é o mantra, o apoio que damos uns aos outros,
a energia que despertamos
(o fato de que nós tocamos
partilhamos alimento)
na natureza buda
de todos, amigos e inimigos, feito milhões de minhocas
cavando sob esta estrutura
até que ela desabe.


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