Sonho e utopia

Sonho e utopia
(Ilustração: Marcia Tiburi/Revista Cult)

 

Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de fevereiro de 2021 é “sonho”.


O sonho é real, são sinapses e colapsos mentais à revelia do sonhador, que remanescem, às vezes. Parte do sonho migra do inconsciente para o consciente, caminho material de bioquímica ainda não explicada.

A utopia não é sonho, por irreal que é. Sonhar uma vida diferente não é sonho, portanto.

Sonhos são registrados – eu os transcrevo para cadernos de anotações –, são pretérito. Utopia pode ser também escrita, porém descrita na classificação de ficção. E por que a indevida sinonímia? Porque nos faltam palavras, ou melhor, nos falta o devido entendimento do que as palavras sonho e utopia querem dizer. Elas – as palavras – são existentes, são reais, ao contrário do que significam.

Exemplos? O sonho de estar nu é hoje substituído pelo da saída à rua sem máscara. Sonhos de queda livre, de se afogar em águas sem cor e sem temperatura definida, o de retorno a moradas da infância, os cheiros das cadeiras e cadernos escolares, sabores de comidas caseiras. Esses são os sonhos, pretérito de vida resgatada de alguma forma dentro do cérebro pensante, ainda que inconscientemente. O devir, chamado erroneamente de desejo sonhado, será realidade dentro da tristeza do inexorável, ou será utopia, no âmbito da felicidade jamais alcançada.

Entre o nebuloso pretérito dos sonhos e o impossível futuro da utopia, sigamos com o presente em curso, em marcha, em solavancos.

Adilson Roberto Gonçalves é pesquisador da Unesp,
membro da Academia de Letras de Lorena, da
Academia Campineira de Letras e Artes e do
Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas.

 

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