Sobre a minha mãe
(Arte Revista CULT)
Por Fernanda Telles Rodrigues Caldas
Criar, costurar, bordar, tricotar, plantar, lavar, passar, cozinhar, pintar, apreciar, admirar, aprender, conhecer, passear.
Tecidos, rendas, tesouras, agulhas, dedais, máquinas de costura, revistas de moda, pontos à mão e à máquina, flores brotadas da terra, flores brotadas de fitas, ora enroladas no palito, ora costuradas com agulhas finíssimas, ora bordadas, lãs, papéis, tintas.
Comida do dia-a-dia, farofa, bacalhoada, feijoada, empadão de camarão, fritada de banana, pudim. Casa impecável, admirável senso estético.
Fazia qualquer coisa com suas mãos, era perfeccionista. Jamais parou de aprender, era a encarnação do DIY. Se fosse possível resumir as mães, esse seria o resumo da minha.
Preocupava-se enormemente com a independência financeira de suas filhas, tendo sido ela mesma, sem saber, uma empreendedora e pequena empresária. Bem pequena, eu brincava embaixo da sua mesa de trabalho, recortando pessoas das revistas velhas de moda e dando a elas nomes esdrúxulos inspirados nas pessoas da família mesmo, afinal minha avó se chamava Oswalda, a tia avó Hermengarda. Assim, ela podia equilibrar o dilema atualíssimo, cuidar das filhas e trabalhar.
Nada em sua vida foi grandioso, tudo foi rico. Com ela aprendi a admirar coisas muito simples (um papel, um guardanapo, uma linha…) e me sentir preenchida, o que acho um luxo, principalmente nos tempos de hoje. Algumas coisas consegui aprender, outras, desafortunadamente, não, e estou aqui num lamento só. Como pude mesmo não aprender a fazer a fritada de banana, a florzinha enrolada no palito? Que displicência! Mas, com o que consegui aprender, me tornei um pouco a minha mãe e posso assim eternizá-la dentro de mim.
Nada foi, é ou será perfeito na criação do filho, aliás passa bastante longe disso, mas há, sem dúvida, muita generosidade e desapego nessa jornada. Uma mãe dá às filhas e filhos sua visão de mundo e significa todo um universo, de forma singular, ajudando na árdua busca de se preencher a existência.
Quando morre a mãe, morre a filha.
Marília Telles
(1) Comentário
Lindo texto. Emocionante!