Prisioneiros de nossa própria cultura?
Salvador Dalí, Metamorfose de Narciso, 1937 (Arte Revista Cult)
Alguém pode ser prisioneiro de sua própria cultura? A questão pode parecer estranha, mas revela uma interrogação fundamental que se esconde por trás das propostas contemporâneas de pluralidade cultural (multiculturalismo) e de diálogo intercultural.
Se a questão se põe é porque, acima de tudo, o sentido mesmo da noção de cultura evoluiu nos últimos séculos. Para o humanismo do Renascimento, a cultura remetia à ideia de cultivar o espírito humano e formar o pensamento para elevarse à razão universal. Educar-se ou cultivar-se implicava necessariamente ultrapassar particularismos para abrir-se aos horizontes mais vastos da cultura universal. Mas, com o fortalecimento do nacionalismo europeu nos séculos 18 e 19, vê-se desenvolver a noção de cultura nacional. A partir de então, cada nação teria sua própria cultura, ligada a uma língua, a crenças, a costumes e a tradições particulares que veiculariam certa visão do mundo.
Esse uso particularizante da noção de cultura desenvolveu-se largamente, a ponto de cada indivíduo parecer possuir uma cultura própria e decorrente do modo único como ele acumula uma multiplicidade de pertencimentos (nacional, religioso, social, linguístico, político etc.). Os diferentes pertencimentos culturais teriam um impacto significativo à medida que determinam fortemente a pessoa que nós somos e, sobretudo, nossas maneiras de pensar e de ver o mundo.
O mito da mônada cultural
Alguns filósofos tiraram consequências radicais dessa nova compreensão da noção de cultura. Tais cons
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