Por uma psicanálise excêntrica
(Foto: Acervo pessoal)
Pensando no tema do dossiê desta edição, o que significa a vulva para a psicanálise?
A primeira associação que faço com essa palavra, raramente utilizada pela psicanálise, é de um campo de batalha. Diferentemente do pênis, cujas intumescência e detumescência são facilmente perceptíveis e no qual o orgasmo é explícito, a vulva se furta ao olhar. É ali que se trava a batalha sobre a função e o sentido do clitóris e da vagina, zona de disputa histórica. Em torno dela se dá a discussão sobre o que se passa no prazer feminino, se ele existe mesmo ou não, como ocorre, se no clitóris, na vagina. Freud precisava explicar como a sexualidade da mulher se associaria ao imperativo reprodutivo, uma vez que o prazer feminino não passava necessariamente pelo canal vaginal, por onde entra o espermatozoide. Já no homem, ejaculação e orgasmo são indissociáveis. A solução de Freud é a hipótese amplamente criticada do “orgasmo vaginal”, suposta evolução do orgasmo clitoriano do qual a mulher deveria abdicar. Tema debatido por Thomas Laqueur, que mostra como Freud usa a teoria do sexo único e a teoria dos dois sexos concomitantemente quando fala da sexualidade feminina.
Além disso, a vagina é o que eu chamo, em meu livro Manifesto antimaternalista (Zahar, 2023), de “pista falsa” sobre nossa origem. É dela que nossos corpos emergem e se supõe que, a partir dela, poderíamos responder sobre nossa origem. Mas a reprodução de corpos não coincide com a reprodução de sujeitos, e não há nada que a biologia possa responder sobre iss
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