Por um amor que não exija a cura: crianças trans, terapia em dia e coaches de relações

Por um amor que não exija a cura: crianças trans, terapia em dia e coaches de relações
Lágrimas de um Porvir (2022), de Caru Brandi. Parte da exposição individual “Fábulas contrassexuais: seres além- -mundos”, no Espaço Força e Luz, Porto Alegre, 2024
  O amor no século 21: difícil de achar, escasso, quase impossível. É que agora as relações estão em crise, acometidas por ghostings, love bombing, medo de envolvimento, falta de comprometimento etc. Esse diagnóstico se repete: nos livros, nas revistas, nos podcasts, nas redes sociais. Nessas mesmas mídias, há também um imperativo que não cessa de se repetir: cuide-se, trate-se, melhore-se. Por quê? Para gerir individualmente os sofrimentos causados pelo mundo do trabalho, sem dúvidas, mas também porque é preciso praticar e ritualizar o amor-próprio. Amar-se em primeiro lugar, amar-se independentemente dos outros. Das sessões semanais com um psicólogo à skincare, os sujeitos investem neles mesmos. Sim, está faltando amor no mundo, por isso, antes de mais nada, parta para uma jornada de autoconhecimento e amor por si – tomando cuidado, claro, para não se amar demais e ser chamado de narcisista. O diagnóstico da escassez do amor e o imperativo do auto­cuidado atrelado à necessidade do amor-próprio formam, no entanto, um paradoxo: o aprendizado do amor implica a existência de um outro, ninguém aprende o amor estando só. O amor como gestão de si aniquila o que é próprio do amor: a existência da alteridade. Como começa o amor para um indivíduo? Para a psicologia e para a psicanálise, certamente na infância. Nos primeiros anos de vida da criança, o amor recebido costuma ser o da família. Parece um consenso que as crianças devem ser amadas. A família, no entanto, também pode ser o espaço da violência, do abuso, do ódio.

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