Outro ataque terrorista à América é inevitável

Outro ataque terrorista à América é inevitável

Richard Rorty acaba de ter um de seus últimos livros publicado no Brasil – Pragmatismo e política. Aposentou-se recentemente pela Universidade de Stanford. Em entrevista, concedida a Paulo Ghiraldelli Jr., Rorty fala de seus gostos no campo da cultura e da política.

CULT – Professor Rorty, fale-me sobre seus filmes favoritos. Quais são? Conte o que gosta neles.
Richard Rorty —
Meu filme favorito é uma antiga comédia inglesa chamada As oito vítimas, uma paródia do sistema de classes inglês, no qual o ator Alec Guiness é brilhante. Dos recentes, estou impressionado com um filme chamado No limite, que fala sobre a vida em Los Angeles nos dias de hoje.

CULT — E programas de TV?
R.R. –
– Como vários intelectuais americanos de esquerda, eu sou muito fã da série The West Wing – Nos bastidores do poder, que incorpora a maioria das minhas fantasias sobre o que eu faria se fosse o presidente dos Estados Unidos.

CULT — O que você acha da TV americana? Nós podemos saber o que queremos saber assistindo aos jornais televisivos? E os jornais impressos?
R.R. —
O jornalismo na TV americana é bem dividido quanto aos grupos que o assistem.  Ele se divide entre pessoas de direita (como por exemplo, aqueles que assistem à transmissão pela Fox Network) e pessoas de esquerda (que assistem ao canal público). O jornal a que você assiste é determinado pela filiação política a qual você pertence. Como um bom cara de esquerda, eu respeito o The New York Times, como sendo um confiável fornecedor de informação. Mas as pessoas que votam no Bush não o estimam tanto.

CULT — O que você pensa sobre a Internet?
R.R. —
A Internet é simplesmente um instrumento de comunicação, mas um instrumento que, no final das contas, possibilita grande escala cultural e mudança social.

CULT — Você escreveu sobre Nabokov e outros, mas e agora, você está escrevendo alguma coisa? Você tem um bom livro em suas mãos atualmente?
R.R. —
O recente romance de Ian McEwan, Saturday, não é um grande livro de sucesso, mas é um bom romance. Há bom tempo não tinha lido algo assim. É uma maravilhosa explicação do estado de espírito da classe média abastada e privilegiada do Ocidente, confrontada com a realidade de que não é razoável resistir à presente ordem, o que, enfim, é improvável que se possa resistir, e que as esperanças por justiça social não são razoáveis para serem realizadas.

CULT — O que você tem a dizer sobre filosofia trabalhando como literatura? Isso é possível? Ou você acredita que a literatura esteja funcionando como filosofia?
R.R. —
Eu acho útil para considerar a filosofia como mais um gênero literário. Eu concordo com Whitehead que a filosofia ocidental pode ser pensada como um gênero literário que nada mais é que nota de rodapé da obra de Platão. Pensar sobre ela dessa forma é um aperfeiçoamento no pensar sobre isso como o amor ao saber, ou como a tentativa para solucionar eternos problemas.

CULT — O que você gosta de ouvir?
R.R. —
Principalmente as músicas compostas antes de 1850. Os compositores mais recentes que aprecio ouvir são Richard Wagner e Johannes Brahms.

CULT – O que pensa sobre a educação americana?
R.R. —
Nós temos as melhores universidades do mundo, e um sistema educacional fundamental e médio muito ruim. No entanto, educação nos Estados Unidos ainda serve para facilitar a mobilidade social, apesar de que não na dimensão que isso foi feito no passado.

CULT — Tem visto o debate Criacionismo X Darwinismo nas escolas?
R.R. —
A política populista da direita, em vários Estados dos Estados Unidos estão, surpreendentemente com sucesso, trabalhando na mobilização da opinião pública para pressionar os professores de biologia da escola secundária a dizer que a evolução é “meramente uma teoria”. Essa é uma importante derrota para a esquerda. E isso faz renascer um conflito que nós pensávamos haver terminado.

CULT — Você assistiu aos filmes de Michael Moore?
R.R. —
Não creio que o filme do Moore, sobre o Bush, tenha sido muito bom. Mas ele certamente causou alguns danos na verdade a respeito de Bush para a atenção pública.

CULT — Você acredita que os Estados Unidos são um país mais conservador hoje?
R.R. —
A política dos Estados Unidos está rapidamente se voltando para a direita e provavelmente continuará assim. Os republicanos provavelmente continuarão a governar o congresso por um longo tempo.

CULT — O que você pensa sobre os Estados Unidos e o terrorismo nos dias de hoje?
R.R. —
Acredito que outro ataque terrorista bem-sucedido é inevitável, mais cedo ou mais tarde, e que os republicanos aproveitarão do mesmo modo um ataque como uma justificativa para tirar muitos dos nossos direitos tradicionais de cidadãos à medida do possível.

CULT — Você acredita que nós podemos sustentar as idéias centrais apresentadas no seu artigo “O fim do leninismo, Havel, e esperança social” atualmente?
R.R. —
Ninguém havia proposto uma alternativa para uma economia de mercado que tivesse alguma chance de sucesso. Foi o que disse naquele texto. Sim, eu ainda concordo com o que eu disse no artigo.

CULT — Fale-nos sobre ciência e filosofia. Nós teremos um retorno à metafísica?
R.R. —
Eu vejo Freud, Marx e Nietzsche como “redescritores”  heróicos. Davidson, Wittgenstein e Brandom são meus filósofos “analíticos” preferidos, mas  eles não são muito lidos pelos estudantes de graduação na Filosofia. Isso é o futuro, no bom sentido. Mas sobre voltar à metafísica… Nós já temos a volta à metafísica na própria filosofia analítica. Isso toma a forma de disposição, na filosofia analítica, de levar a sério questões ruins, como por exemplo “qual é o lugar do valor” ou “qual o lugar da consciência ou intencionalidade em um mundo de partículas físicas?”

Tradução: Francielle Maria Chies

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