O fio, o cu e a língua
Fefa Lins, Quando o tesão passa, 2019. Óleo sobre tela. FOTO DE SOFIA LUCCHESI/CEDIDA PELA GALERIA AMPARO 60
Gosto de pensar que entre psicanálise e teorias queer há, a despeito de suas diferenças, um mundo de semelhanças, afinidades e um certo horizonte comum de desconstrução. Afinal, em ambas está em jogo um rechaço ou, no mínimo, uma desconfiança diante da substancialidade identitária. Entre lacanianos, a experiência de uma análise poderia ser, por que não?, pensada como um longo percurso de queerificação do falasser: espera-se deixar cair a paixão pela unidade e a universalidade da norma fálica. No limite, o fim de uma análise é a própria penetração da alteridade real do sexo no sujeito, possibilitando o que chamamos de gozo suplementar, não-todo, transviado.
Também suponho, com frequência, que tal afinidade não é apenas um encontro fortuito entre saberes e práticas subversivas que buscam um rompimento da norma dominante, mas que partilham solos teóricos e epistemológicos comuns. Lembremos que a recusa da patologização da homossexualidade – e, nas palavras de Judith Butler, a “pulsão queer” de Sigmund Freud – tanto formam a base de uma série de reflexões empreendidas pelos feminismos e pelas teorias de gênero como apontam para uma crítica do “Homem” iluminista. Somos subversivos, contra a normatividade cultural e a favor de uma singularidade do desejo, além de reconhecer que o inumano constitui o humano e vice-versa. Tudo certo.
Porém, ao escrever este texto, me pus a pensar: por que eu gostaria tanto de fazer casar psicanálise e teoria queer? Insistir nas semelhanças não seria, no fundo, uma unif
Assine a Revista Cult e
tenha acesso a conteúdos exclusivos
Assinar »